segunda-feira, 26 de julho de 2010

P42 A lataria e o martelo

Modelos políticos e uniformes...
Prossegue sem maiores novidades e provavelmente terá o velho e conhecido fim de impunidade para os envolvidos a tragédia que se abateu sobre a atriz Cissa Guimarães, que teve o filho Rafael Mascarenhas atropelado e morto por um motorista que fazia um racha num túnel interditado no Rio de Janeiro, onde Rafael andava de skate com os amigos.

Depois do atropelamento um caso escabroso começou a ser mostrado para todo o Brasil após a identificação do motorista, que ao mesmo tempo em que era mostrado próximo do túnel sendo parado por uma viatura da polícia militar e sendo liberado, trouxe à tona revelações surpreendentes. Segundo ele os policiais sabiam do atropelamento e exigiram uma propina para manterem-no oculto. Assim que saiu a notícia o comandante dos policiais, em entrevista coletiva teceu todos os elogios possíveis aos dois envolvidos, até que a Rede Globo mostrou um vídeo de câmeras de segurança que quase confirma a versão do motorista. Na frente de imagens indesmentíveis, o comandante deixou de lado os elogios e anunciou a prisão dos envolvidos.

O que fica claro no episódio todo, vendo as imagens dos comandantes da Polícia Militar, é uma sensação insuportável da visão de conceitos políticos e sociais dos mais anacrônicos estampados em suas fardas. Quem viu os noticiários se lembra do comandante da corporação com sua farda ostentando uma inacreditável profusão de botões e enfeites de metal nos ombros que nos tempos atuais beiram o ridículo. Tanta lataria para tão tristes resultados. Aliás em todos os acontecimentos onde apareça algum comandante da polícia militar de qualquer estado brasileiro a imagem é sempre essa: um verdadeiro mostruário de botões, estrelas, comendas, latinhas e coisas do tipo. A explicação para isso, fazendo uma comparação com uniformes de outros países que se regem com outro pensamento social e político é simples.

Um exemplo marcante vem do exército americano. Pouco depois da virada do século passado os militares americanos deixaram seus uniformes mais contidos, com as antiquadas e excessivamente vistosas comendas de lata fora de seus uniformes, trocadas por pequenas tiras de tecido que indicavam a especialização e títulos de honra de seus portadores, com o mínimo de enfeites de metal em seus trajes, usados apenas para a diferenciação de traje militar com os símbolos da nação e da arma a que serviam.

Isso vem da mentalidade política dos americanos, adquirida na época da Revolução Americana de 1776 quando se revoltaram contra a tirania do rei inglês e efetivamente lutaram para ter sua nação. Avessos aos títulos de bajulação e sujeição política, retiraram do tratamento para as autoridades os títulos honoríficos e de nobreza exagerados, na visão deles apenas uma forma de humilhar o cidadão e submetê-lo a uma desigualdade absurda.

A visão da farda do General George C. Marshall mostra bem essa concepção. Um dos comandantes militares mais conceituados da 2a. Guerra Mundial, arquiteto do Plano Marshall que reergueu a Europa e estrategista de planos de batalha decisivos, a figura e a farda do General Marshall mostram a felicidade e o acerto dessa concepção política com sua sobriedade imponente.
Já do nosso lado, podemos pegar uma figura exemplar do apego e até mesmo da voracidade por títulos honoríficos e de nobreza desmesurados e ao mesmo tempo vazios, também passados para adornos e enfeites de trajes oficiais e fardas, assumidos e cultuados como forma de tratamento e visão das autoridades do modo mais absurdo possível, afastando toda e qualquer idéia de igualdade e comedimento. O maior exemplo está na farda dos militares sul-americanos. Ela retrata bem o que aconteceu nos países de língua espanhola e no Brasil, quando as metrópoles coloniais estavam tão enfraquecidas que seus imperadores não tiveram outra escolha a não ser abandonar suas colônias, que no mesmo momento foram tomadas por mandatários locais que absorveram assim nos tratamentos exigidos para seus nomes e nas espalhafatosas fardas que criaram, a postura dos velhos imperadores perdulários e atrapalhados, que tinham em seus herdeiros seus mais perfeito e em alguns casos, pior retrato.

Como não poderia deixar de ser, tal pensamento político, um verdadeiro rosário de misérias morais, tomou forma nos títulos honoríficos absurdos e nas risíveis fardas, cheias de botões rutilantes, latarias inacreditáveis nos ombros e enormes medalhas no peito, que causavam risos entre comandantes militares americanos, com suas fardas sóbrias e elegantes.
No vestuário das polícias militares do Brasil, essa mentalidade ultrapassada e visão política anacrônica continuam na forma dessa lataria toda, também sempre brilhando toda vez que um comandante policial militar aparece num caso desses.

Infelizmente, como vimos no último caso de corrupção acontecido, onde os policiais militares tentaram extorquir o causador do acidente, não há o que conserte essa lataria.

A não ser como os dois policiais deixaram entrever com sua tentativa de extorsão, um martelinho de ouro, tão conhecido nas funilarias.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

P41 O náufrago

Naufragado em si mesmo...
Reapareceu de forma melancólica por esses dias o por assim dizer ainda líder Fidel Castro, que um dia figurou nos noticiários do mundo como o libertador de Cuba, ao derrubar em 1959 a ditadura de Fulgêncio Batista, que havia se tornado um condomínio de empresas e mafiosos norte-americanos. Com a ditadura de Batista apoiada nas ações de uma polícia e forças armadas corruptas e de extrema brutalidade, Castro e seus companheiros de luta apareciam nas fotos da época como a imagem perfeita dos revolucionários românticos e salvadores de um povo oprimido.

Infelizmente devido á sua orientação pró-soviétiva e ao bloqueio norte-americano, seu governo, que ainda tinha um certo respaldo da população, com o povo exigindo seu retorno ao poder em 1959 logo após um desentendimento com o presidente Manuel Urrutia mesmo com sua postura ditatorial, logo levou Cuba a outro martírio que dura até os dias de hoje, mesmo tendo Castro caído doente em 2006, quando teve que deixar o poder nas mãos do seu irmão Raul Castro. Quando o povo cubano exigiu sua volta, o via como o déspota esclarecido, que apesar de governar com mão de ferro, faria de tudo para o bem do povo.

Amargurado e depois impotente sem condições de reagir, o povo cubano viu que Castro, seguidor incondicional do pensamento soviético tanto nos moldes de administração como no culto stalinista da veneração devida pela nação à figura do ditador, havia se transformado no oposto do que ele sonhara e aclamara.

Uma das mais repressivas ditaduras do mundo surgia e com ela o sofrimento do povo cubano que dura até hoje, só tendo a esperança de dias melhores para os próximos anos porque assim como seu criador, o regime cubano se esvai a cada dia e a presença norte-americana se faz cada vez mais próxima. No dia em que Cuba reatar relações com a América, terá ruído de vez o que um dia se chamou Revolução Cubana. Ficará na memória a longa e penosa caminhada do povo de Cuba e ao contrário do que um dia disse Castro, a História não o absolverá.

Um dos símbolos da opressão da ilha é a marinha cubana que todos os dias patrulha o alto mar, mas de forma particular. Sua missão não é impedir a entrada de possíveis invasores, já que não tem forças para isto, mas interceptar os fugitivos da ilha que tentam em barcos improvisados e em bóias alcançarem o litoral americano a 170 kms. de distância. Ao longo desses anos de poder do regime castrista, muitos conseguiram chegar até as praias americanas, um número jamais sabido afogou-se no mar e outro número só conhecido das forças cubanas terminou capturado e repatriado para prisões em Cuba.
Cedo começaram as divergências contra a visão ditatorial calcada no personalismo e infalibilidade das decisões do ditador, ainda mais na absoluta concordância que lhe era devida sob pena de prisão ou execução, exatamente como nos tempos de Stalin na antiga União Soviética.

Emblemática da postura adotada por Fidel Castro sobre a figura do dirigente comunista é uma das memórias de Nikita Krushev, quando presente num discurso feito por Stalin. Seu poder de intimidação era tal que por inacreditáveis 5 minutos os comissários políticos presentes no discurso não paravam de aplaudir e ovacionar Stalin. Parar de aplaudir ou sentar-se quieto equivaleria a ser preso pelos membros da polícia política e daí ser encaminhado para a prisão. Só pararam quando o ditador fez um sinal. Essa foi a visão que Castro preferiu para governar Cuba. E foi assim que os cubanos se acostumaram a ouvir em pé, discursos de 3 a 4 horas do seu líder, enquanto os membros do CDR, o Comitê de Defesa da Revolução andavam entre o povo.

Um dos primeiros a discordar foi Huber Matos, que lutou junto com Castro na revolução, mas terminou preso em 1959, condenado a uma pena de 20 anos, saindo inválido da prisão. Na época membros do governo que ousaram questionar a prisão dele foram destituídos de seus postos e colocados sob vigilância.
Camilo Cienfuegos, também combatente da revolução e que efetuou a prisão de Matos, morreu num acidente de avião ao retornar para a capital. Carismático e bem aceito pelo povo cubano, poderia ter influído em alguma mudança na forma de governo, mas isso permanece no ambito das especulações.
Outro líder que também dividia as opiniões e atenções em Cuba era Che Guevara, que também carismático e arrojado fazia sombra contra a figura de Fidel Castro. Decidindo partir em uma tentativa de subverter os governos da América Latina a partir de uma revolução na Bolívia, viu-se, depois de internar-se nas selvas bolivianas, completamente abandonado pelo regime cubano, que ao mesmo tempo que mantinha abastecidos esquerdistas de outros países sul-americanos, deixou Che Guevara numa situação de inanição.

Caçado por tropas treinadas por forças especiais americanas, logo terminou preso e executado. Alguns estudiosos da revolução cubana veem aí uma silenciosa e bem sucedida manobra de Castro, condenando seu antigo rival a um fim obscuro.

Seja como for, tendo levado o povo cubano a um longo período de opressão, onde privações e pobreza se tornaram o viver comum do dia a dia, assustados com as patrulhas das forças policiais e forçados a reelegerem Castro eleição após eleição, já que só ele era candidato, o cidadão cubano nada podia fazer contra a verdadeira estrutura de vigilância e repressão em que se tornou a ilha, mantida por aquele comandante no qual um dia depositou toda a sua fé.

Assim, de uma forma melancólica termina seus dias na mais completa solidão, cumprimentado por seus partidários e membros próximos do governo que lhe prestam homenagens e cumprimentos por obrigação, mas mais do que isso, por temor.

Hoje sem saúde, Castro se tivesse optado por outra forma de governar seu povo, poderia ser alvo de homenagens sinceras, receber cumprimentos que atestassem a gratidão de um povo e acima de tudo de estar numa praça tomando sol rodeado de pessoas carregadas de respeito por ele, mas seguiu o caminho contrário.

Um triste fim para quem um dia foi a esperança de um povo. Se formos usar a figura do náufrago para exprimir essa solidão, hoje esquálido e doente mas ainda temido, Fidel Castro é a imagem mais bem acabada desse desastre político, sozinho em sua própria ilha de opressão.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

P40 Corações e máquinas

Corações de aço...
Após a reedição de textos sobre o conflito entre Israel e a Palestina, vejo nos jornais que um novo comboio de navios começa a ser organizado para tentar furar o bloqueio até a Faixa de Gaza pelo mar. É mais do que apenas mais uma vez Israel declarar através de seus porta-vozes que irá jogar toda força militar sobre esses navios. Não só a opinião pública mundial estará mais atenta como também começam a aparecer cada vez mais testemunhas do que já aconteceu e do que pode acontecer.

Causa pesar que os filhos de um povo que já esteve cercado no Gueto de Varsóvia durante a 2a. Guerra Mundial pelas tropas nazistas, não veja hoje nenhum erro em proceder como seus antigos captores, quando prendiam e executavam os que levavam alimentos para dentro do gueto de forma clandestina. Fica fácil para Israel acusar tudo e todos de terroristas, de chamar até crianças palestinas de terroristas também enquanto que em seus quadros de fotografias no Yad Vashem ou Museu do Holocausto em Jerusalém o papel das crianças judias quando conseguiam levar alimentos aos judeus cercados no gueto seja visto de forma diferente.

Para Israel nada há de errado em ser indiferente para com o destino de crianças palestinas perdidas em campos de refugiados ou atingidas em bombardeios contra populações civis, enquanto que ao mesmo tempo cobra de forma silenciosa lágrimas dos visitantes do museu ao verem fotos de crianças judias executadas pelos soldados nazistas. E que diferença existe entre estes pequenos corpos? Que diferença podemos ver entre os corpos de crianças judias mortas em 1943 por tropas nazistas que sabiam para onde atiravam e entre os corpos de crianças palestinas mortas por soldados israelenses em 2010, que também sabiam para onde atiravam? Que diferença terão as lágrimas então? Os israelenses acham essa comparação injusta, mas caiu no consenso do mundo.

Quando em 1948 se lançaram na hoje tão lamentada criação do estado de Israel, os judeus talvez nem por um instante imaginassem que o povo que varreram a fogo de metralhadoras da terra que diziam ser sua por direito divino pudesse se organizar em um exército de guerrilhas que sobrevive aos tempos e adota nomes que refletem seu extremismo. Diziam os sionistas que a criação de Israel era a destinação de uma terra sem povo para um povo sem terra. E os palestinos estavam lá porquê?

Uma cruel ironia da história esse modo de ver as coisas. O nazismo doutrinava seus soldados para verem como povo apenas o povo ariano, um povo eleito pelas suas virtudes proclamadas pelo regime. Os habitantes de outros países não eram um povo, eram apenas um obstáculo a ser removido pela força militar. O sionismo não pensa muito diferente. Terra apenas para o povo eleito, pelas suas virtudes auto-proclamadas e por um decreto divino. Quanto ao resto dos habitantes da região, apenas um obstáculo a ser removido pela força das armas, como ensinam aos seus soldados. Quem pode esperar a paz agindo assim? Vendo nos livros de história como terminou o nazismo, é pouco provável que o sionismo tenha um fim diferente.

Para Israel é fácil chamar o grupo palestino Hamas de grupo de terrorista. E o que era o Irgun no passado, na época da criação do seu estado? Um grupo judeu extremista que cometia atos de terrorismo contra os civis palestinos e as tropas britânicas em 1948, como no atentado contra o Hotel King David que matou 91 pessoas. Mas esses são diferentes, eram heróicos combatentes sionistas. Falar que eram terroristas estraga o cenário. Terroristas são os combatentes do Hamas, que faz a mesma coisa que o grupo judeu fazia em 1948. Mas aí é diferente. Enquanto isso crianças judias choram ao serem socorridas após mais um ataque de foguetes contra uma cidade israelense. E fazendo tudo o que fazem, os israelenses esperavam receber o que em troca? Dos dois lados, crianças são as maiores vítimas. Dos dois lados, pequenos feridos que viram a morte de um familiar ou de um amigo tornam-se radicais dispostos a tudo.

O que é mais impressionante em todo esse cenário é que aos poucos, como numa transformação silenciosa, em cada pessoa o coração vai se tornando de aço, tão igual como o das armas ou máquinas de guerra. Dos dois lados as batidas dos corações deixam de ser ouvidas como são.

Passam a serem ouvidas no ruído de uma metralhadora ou nos passos cadenciados da interminável fila de soldados suicidas que se apresentam contra Israel.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

P39 Sementes do ódio

Uma colheita amarga no futuro...

Em suas contínuas incursões contra os palestinos, Israel amarga hoje uma triste colheita. Todas as sementes plantadas no passado deram somente espinhos. Mas mesmo assim não existe entre os membros do alto comando militar israelense a idéia de tentar frutos da paz para o futuro. Enquanto continuarem a ter o apoio militar norte-americano, jamais irão plantar outras sementes. Aliás, o próprio Estado de Israel é fruto de uma semente que os americanos se arrependem amargamente de terem plantado no lugar que uma vez foi chamado de jardim do Éden. Texto publicado originalmente em 14.01.09 em
http://vellker.blog.terra.com.br

Os deuses vencidos

Divindades também caem...
Com a notícia do recente disparo de mísseis do território libanês, os israelenses levando em frente sua ofensiva na Faixa de Gaza prendem a respiração e o temor da abertura de uma nova frente de combate faz todos os estrategistas de Israel estremecerem. O custo que isso representaria em termos de soldados, equipamentos, baixas e uma nova onda de antipatia mundial, justo no momento em que o mais fiel aliado de Israel, o já quase ex-presidente George Bush não dá mais ordens é um cenário que deixa seus generais e políticos sem dormir.
O que os israelenses começam a sentir de forma cada vez mais desanimadora é que a onda de ódio que foram alimentando desde que se instalaram no Oriente Médio em 1948 a cada dia se torna mais e mais preocupante. Em última análise, Israel, como em 1973, pode apelar para seu poderio nuclear que nunca foi confirmado e ao mesmo tempo nunca foi desmentido pelos seus dirigentes, mas num cenário desses, a intervenção da Rússia e da China, em implícita ameaça de entrar num conflito desses não é nada desprezível. Em 1973, com o avanço das tropas egípcias, segundo antigos membros de serviços secretos, Golda Meir ordenou que 13 ogivas nucleares transportadas por aviões fossem colocadas ao lado dos aviões. Com os satélites americanos e soviéticos captando a radiação das ogivas e prevendo o desastre que isso poderia representar, em alguns dias conseguiram parar o conflito.
Hoje, com o cenário na região sempre mais tenso, pouco se pode fazer num caso desses. A Síria que nunca renunciou à sua decisão de reaver as colinas de Golan tomadas por Israel em 1967, países como o Líbano com seus radicais que cresceram a partir da ofensiva de Israel em 1982, onde após uma sangrenta ofensiva Israel provocou enormes baixas na população civil e ao mesmo tempo viu suas forças paralisadas nos combates de rua em Beirute, o crescimento de movimentos como o Hezbolah, Hamas e o crescente poder militar do Irã criam uma situação que nos permite entender porque os filhos dos judeus que emigraram para Israel hoje pensam em como sair de lá.

Apesar de acreditar que se defende, o cidadão israelense já começa a pensar que vai chegar o dia em que será impossível manter tantas frentes de batalha. Um país que apesar de sua invejável posição no campo da educação e avanços tecnológicos, não consegue entender porque desperta tanto ódio. Mesmo uma parte dos israelenses já começa a pensar que torna-se vital para seu futuro, para sua sobrevivência pura e simples reverem seus conceitos de estado, de religião, de nação, de relacionamento com seus vizinhos e acima de tudo retirarem do poder os líderes que no fundo sempre se guiaram pela visão religiosa, extremista e segregacionista dos rabinos ortodoxos, na construção do estado do Eretz Israel, que pressupõe, é claro, a recriação de Israel em fronteiras definidas pelos ortodoxos religiosos. Tal visão só pode conduzir para o desastre.
Os radicais islâmicos com a crescente influência e ajuda de homens no poder como Mahmoud Ahmadinejad, que viveu no Irã a guerra contra o Iraque na década de 80 trabalhando no serviço secreto iraniano e grande conhecedor de muitos dos segredos daquela região e que depois de sobreviver a tudo, se alicerça como um dos poderes militares que mais crescem na região e ainda por cima dá ajuda a esses grupos, as opções de Israel começam a ficar cada vez mais limitadas, se forem baseadas somente no confronto militar, que até hoje, em larga escala é sustentado pelo governo americano a fundo perdido de mais de 2 bilhões de dólares por ano, enquanto que os árabes, tendo perdido a limitada ajuda da União Soviética em 1991, continuam por seus meios a crescer em força militar. Nas milícias islâmicas até mesmo crianças já passam por treino militar, acreditando ser um dever quase sagrado o combate. No futuro de Israel, muito antes de ele chegar, já existem esses inimigos.
Hoje, em meio ao tumulto dos combates na Faixa de Gaza, com uma máquina militar imensa e que avança lentamente com o apoio de aviação e artilharia pesada, lutando contra radicais islâmicos que dispõem só do equipamento leve de infantaria, mas combatem sem cessar e ainda ao custo da própria vida disparam os mísseis que podem, no fundo, soldados e cidadãos de Israel sentem, sem nada dizerem, que uma guerra assim já é de antemão perdida. Mais dia menos dia, virá o acerto de contas, coisa que muitos israelenses tentaram avisar desde 1948 mas foram ignorados.
Resta a homens como Ehud Olmert e seus generais e soldados, nos momentos em que estão a sós com seus pensamentos, assistirem a tudo como deuses vencidos.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

P38 Professores e aprendizes

A lição aprendida justifica tudo...

Israel continua por esses dias a mostrar que seus ataques contra a população palestina sitiada na Faixa de Gaza parecem ter uma motivação mais profunda. Se fizeram comigo posso fazer com os outros. Por tudo que os judeus passaram na 2a. Guerra Mundial, os comandos militares israelenses agem como se tudo fosse possível. Militarmente é, mas humanamente não. Mas parece pouco provável que enquanto forem abastecidos pelos norte-americanos, que os israelenses venham a mostrar qualquer comedimento. Texto publicado originalmente em
em 12.01.09 em http://vellker.blog.terra.com.br

O aprendiz

Um conto escrito pela vida...
Existe um filme muito bom, baseado num conto de Stephen King, mestre do horror, chamado "O Aprendiz" que conta a história de um estudante americano, que por uma série de acasos descobre que um idoso alemão, quase seu vizinho, era na verdade um criminoso de guerra. Ao confrontá-lo com a ameaça de contar tudo para a polícia, o velho oficial alemão pergunta o que ele quer. Ele diz que mantém tudo em segredo, desde que ele lhe conte em detalhes tudo o que viveu na 2a. Guerra Mundial, como comandante de um campo de extermínio. Em certa altura das conversas, o antigo oficial alemão vê no rapaz um aprendiz muito capacitado.

Em que pese a ficção do conto, resta saber o desfecho do conto ainda sendo escrito pela vida. Nesse conto, no dia 20 de janeiro de 2009, Barack Obama, o primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos assume seu cargo, enquanto a vida por uma série de roteiros que ela mesmo escreveu continua mostrando mais coisas a ele. Resta saber como ele reagirá ao aprendizado. Já recebendo ao mesmo tempo que o presidente Bush todos os relatórios dos serviços de inteligência americanos, Barack Obama começa a mostrar outro rosto para as câmeras. No lugar do sorridente candidato, começa a surgir agora um rosto apreensivo.
Começando a saber de coisas sobre a situação mundial que antes como candidato ignorava, Obama entra no caminho dos grandes aprendizes do maior poder mundial, passando a ser leitor atento dos grandes segredos do mundo, consubstanciados nos relatórios da CIA e da NSA, a pouco conhecida e poderosa National Security Agency, que além da coleta de bruta dados da CIA, um eufemismo para as operações do serviço secreto que custam vidas mundo afora, trazem também relatórios da coleta eletrônica de dados da NSA, que só na década de 70 já era capaz de informar ao governo americano quais seriam as decisões de Leonid Brezhnev, secretário geral da União Soviética simplesmente porque era capaz de captar as emissões que ele julgava secretas entre seu avião e seus ministros.

Barack Obama começa a ver assim a situação de perigo em que caminha o mundo, uma situação que não deixa de ter semelhanças com o velhinho do conto de Stephen King, que num exercício de imaginação, agora morando num apartamento perto da Casa Branca, lhe contará sim tudo o que ele viveu no mundo desde 1939, desde que ele mantenha tudo isso para ele e para os que já sabem. Sim, infelizmente tem quem saiba e se aproveite disso.
Os grandes problemas do esgotamento das reservas de petróleo, vitais não só para os Estados Unidos, mas para o mundo todo. Hoje, com mais de 60% de seu consumo garantido pelo petróleo que vem o Oriente Médio, viram-se os americanos com a desastrada presidência de George Bush invadindo o Iraque pelo real objetivo de garantir sua presença militar por lá e ao mesmo tempo assegurar a exploração e remessa do petróleo custe o que custar. Custou por enquanto a vida de mais de 3.000 soldados americanos e pelo contado, de mais de 90.000 iraquianos, a um custo de bilhões de dólares por ano, preço baixo a pagar se garante a sobrevivência da própria nação americana. Tudo motivado por uma suposta democracia iraquiana e começado num famoso atentado até hoje mal explicado Mas é melhor não falar disso em voz alta.
Enquanto isso, em Israel, a ofensiva contra a faixa de Gaza, muito bem pensada para essa época do ano, teve e terá até seu fim a principal finalidade de pegar o novo presidente americano de surpresa como pegou, antes que ele e seus secretários efetivamente possam a vir dar novas ordens, quando então estarão lidando com um fato consumado muito perigoso e os dirigentes de Israel poderão sentir pela sua reação, se no fundo ele será um bom aprendiz, desses que não criam problemas. O último que tentou reformar para essas estruturas de poder foi o presidente americano John Kennedy empossado em 1961. E que morreu em 1963, num atentado até hoje também mal explicado.
Com seu serviço secreto bem montado, com agentes infiltrados em vários cargos de países árabes, com sua coleta de dados eletrônica com sistemas e rede de satélites espiões próprios, conseguindo informações que são passadas para os serviços secretos americanos e vitais para terem um mapa atual da região, Israel recebe em troca desde as peças dos seus tanques até o combustível para seus aviões e de resto todos os equipamentos para manter sua máquina militar funcionando. Sem isso Israel seria forçado a passar para o seu último grau de intimidação, ou seja, a ameaça do uso de sua força nuclear frente a uma força árabe unida, com o que o Oriente Médio entraria em colapso e a Europa e os Estados Unidos, o mundo todo enfim se veria frente a um desastre sem precedentes na história mundial pela completa desorganização da extração e distribuição do petróleo. Os conflitos que poderiam vir então, num mundo com forças nuclearizadas, ninguém sequer imagina.
É tudo isso que o aparentemente bom velhinho tem contado aos poucos para Barack Obama. Mais ele vai saber a partir do dia 20. E talvez fazer o que for possível. Com a mesma sensação de quem caminha na beira de um abismo. Cada passo é um aprendizado.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

P37 Um caminho sem fim

Há mais de 5.000 anos...

O povo de Israel não deixa de sentir um certo orgulho por ter em seu calendário mais de 5.000 anos registrados. Mas com a história de tribulações e perseguições por que tem passado, é provável que esse orgulho seja mais pesar do que exaltação, no fundo uma silenciosa lamentação que vem mais cedo ou mais tarde na vida de qualquer israelense. Se em relação ao resto do mundo o povo judeu continuar pensando como pensa, terá mais esse tempo de aflição. Jamais se dará bem com o mundo porque na verdade não quer saber do mundo. Mundo é só Israel. Porém com os recentes avanços belicos dos seus vizinhos enquanto seu principal suporte, no caso os Estados Unidos, começam a entrar na fase de progressivo declínio político, incerteza econômica e desgaste militar, os israelenses terão sorte se contarem mais 50 anos em seu calendário. Texto originalmente publicado em 09.01.09 em http://vellker.blog.terra.com.br

O labirinto

Uma guerra sem saída...
Nesses dias em que continua a ofensiva israelense na Faixa de Gaza, fica mais uma vez comprovado que um grande exército nem sempre garante uma vitória. Pior ainda, cada disparo de sua artilharia pode ser mais um estrondo em que se comprova sua derrota.

É o que acontece dia a dia nessa ofensiva do exército de Israel, que apesar do poderio esmagador, hoje se vê na situação de um atirador perdido em uma viela, com a mira do fuzil quebrada, atirando para todos os lados e anunciando o bombardeio indiscriminado da população palestina como uma grande estratégia de guerra. Mapas são mostrados, comboios de tanques avançam e aviões de combate disparam mísseis e bombas, dando cobertura a soldados que completam o cenário avançando.
Pudesse Israel ganhar essa guerra em corações e mentes e não precisaria disparar um tiro que fosse. Para completar a sensação de perda dos caminhos dentro da política e da própria nação, Israel e seus soldados se vêem confrontados com a sensação amarga de que de nada adiantou mostrar a força que tem. Do Líbano, algum grupo temerário de militantes radicais também disparou mísseis que acabaram acertando uma base aérea, coisa ainda não confirmada.

A população palestina, apesar do sofrimento que tem passado ao contrário de esmorecer apóia os militantes radicais, que bem ou mal vão ganhando seu espaço e assim também seus corações e mentes. Resta aos soldados de Israel apreciarem o espetáculo pirotécnico de sua artilharia, passar por regiões desoladas cheias de mortos, terem ciência da verdadeira maré de ódio que despertam e se consideraremm vencedores, para não terem que amargar essa constatação que a cada dia se torna mais pesada do que toda sua artilharia.
Sim, venceram e ao mesmo tempo perderam militarmente. E pior, perdem a cada dia a pouca simpatia que ainda tinham mundo afora e isso coisa que começaram a perder há muitos anos atrás. Apesar de seu imenso poder, ainda assim na fronteira norte de seu país também aparecem outros militantes desafiando esse poder. Que pode fazer Israel? Atacar todo o mundo conhecido além de suas fronteiras? Convocar todos seus reservistas e transformar cada cidadão num combatente? Do quê e para quê, já se perguntam no íntimo muitos dos seus cidadãos, que se um dia sonharam em ir para a terra prometida tão falada, hoje pensam em como ir para outra terra qualquer, onde possam viver em paz. Se a terra prometida exige tanta dor, melhor deixar tudo isso para quem queira.
No íntimo, cada cidadão israelense está cansado de viver com medo, cansado de ter receio de se aventurar fora das fronteiras de seu país, cansado de ouvir os alarmes avisando que mais bombas estão chegando, cansado de saber que protestam mundo afora contra tudo que sua nação faz.
Sem saber o que dizer frente aos protestos da comunidade internacional, os jornais israelenses procuram ser neutros, tentam anunciar que tudo vai bem na frente militar, autoridades como Ehud Olmert, Shimon Peres e Ehud Barak fazem patéticos discursos triunfalistas e moralistas, enquanto que o cansaço em suas vozes mostra que nada sentem de triunfo nem de moral e a população vive tentando não sentir mais angústia do que já sente.
Em 1948 os judeus fizeram de tudo para criarem e proclamarem ao mundo o Estado de Israel. Que se tornou um verdadeiro labirinto de guerras e incerteza. Há 60 anos vagando dentro desse labirinto, os israelenses chamam a isso de terra prometida.

terça-feira, 8 de junho de 2010

P36 Uma escola antiga

Alunos e professores...

Hoje as tropas de Israel começam a levar destruição até mesmo fora de suas fronteiras. Levando além do limite a sua ideologia de direito de retorno à terra de seus ancestrais, todo um povo que um dia teve a simpatia do mundo, hoje joga fora o que poderia ser uma alternativa para não só ter paz mas também no futuro ter seus atuais inimigos como vizinhos depois de uma reconciliação histórica. Um dia uma grande nação se aventurou nesse caminho. Mas era grande o suficiente para terminar apenas dividida pela metade. A Alemanha pôde se reunir em uma só novamente. Israel dificilmente terá essa chance. Texto originalmente publicado em 07.01.09 em http://vellker.blog.terra.com.br

A velha escola

Uma escola de muitos alunos...
Gueto de Varsóvia, 1943. Na foto acima vemos o general Jürgen Stroop, seus soldados e oficiais durante o ataque feito ao gueto, na Polônia em abril de 1943, onde os judeus confinados haviam se rebelado, depois de um longo tempo de sofrimento. Não suportando mais as humilhações, maltratos e as prisões para deportação, aos poucos os judeus organizaram um pequeno exército e se levantaram em armas. Contavam com fuzis, revólveres e pistolas velhas.
Após a invasão da Polônia em 1939, a população judia começou a ser perseguida e grande parte dos judeus de Varsóvia foi confinada numa parte da cidade, em volta da qual os alemães construíram um muro, deixando-os completamente segregados, com o mínimo de alimentos e remédios.
Durante esse tempo, a população judia foi amontoada em uma pequena área, com condições desumanas de vida, sofrendo com isso a ocorrência de doenças, privações, fome.
Nas fotos feitas por pessoas que lá passaram, foi deixado esse testemunho do que faz uma velha escola que é comum a seres humanos de todos os países, seja qual for sua raça ou religião. É a velha escola do ódio. Cenas de um sofrimento imenso foram registradas e existem até hoje. Alguns poucos fotógrafos alemães e poloneses, todos que podiam entrar e sair deixaram essas fotos para o mundo.

Ao enfrentar o pequeno exército de judeus que haviam conseguido contrabandear armas para dentro do gueto, o general Stroop contava com canhões, tanques, metralhadoras pesadas e milhares de soldados. Em maio de 1943 o general enviou mensagem a Berlim informando seus superiores de que o gueto não existia mais. Em Londres, um judeu exilado, Szmul Zygelboim suicidou-se, deixando uma carta onde dizia: "Quero registrar meu protesto contra a passividade com a qual o mundo está vendo e permitindo o extermínio do povo judeu".
Era uma época onde as notícias demoravam a chegar, onde o acontecido hoje podia levar vários dias para que as pessoas ficassem sabendo o que tinha ocorrido num ponto do mundo, se viessem a saber.
Há muito tempo o general Stroop e seus comandados morreram, passaram para o outro lado da vida. Até seus dias finais, muitos soldados que lá estiveram sempre diziam que tinham feito o que achavam certo.
Faixa de Gaza, 2009. Dizendo ser legítima defesa, uma das maiores máquinas militares do mundo, o exército de Israel avança contra a população palestina em retaliação contra os ataques dos militantes do grupo islâmico Hamas, que dispara contra pequenas cidades da fronteira israelense, mísseis que até a ofensiva haviam provocado 4 mortes.

Mais de 400 tanques, mais de 100 helicópteros de combate e caças dos mais modernos disparam obuses e mísseis sem parar. Milhares de soldados seguem tomando cidades. Do lado palestino são contados até agora 702 mortos. Do lado israelense até agora 10 mortos.
Chega a notícia de que 2 escolas mantidas pela ONU foram atingidas por mísseis e obuses, com a morte de mais de 30 crianças. Segundo os israelenses as escolas eram uma base de lançamento de foguetes. Segundo o encarregado da ONU, que supervisionava as escolas presente no local, nada disso é verdade. Pelo mundo afora, diplomatas israelenses esgrimem os mais refinados argumentos para dizer que o que suas tropas fazem é correto. Shimon Peres, pateticamente limita-se a dizer que Israel cuida de suas crianças, ao ser questionado sobre isso. Soldados de Israel, entrevistados no local acreditam estar fazendo o que é certo.
Há 66 anos atrás em Varsóvia, homens de uniforme acreditavam estar fazendo o que era certo. Até o fim de suas vidas diziam isso. Hoje, num exercício de imaginação podemos ver o general Stroop do outro lado da vida, dizendo aos seus homens que afinal, os descendentes do povo que eles perseguiam fazem hoje a mesma coisa.
Claro, esse é um novo tempo, onde as notícias chegam em questão de segundos. Sons, imagens, um relato completo do que está acontecendo chegam a todos os lares do mundo. E parece que o mundo não está tão passivo hoje. Olhando bem tudo isso, o general Stroop pode pensar que no fim de contas, não há grandes diferenças entre seus homens e os que atacam hoje.
E se um dia, eles estiverem no mesmo lugar no outro lado da vida, poderão ver que apesar de tudo, eles tem algo em comum. Frequentaram a mesma velha escola.
Mas fica feio admitir isso. É melhor apenas dizer que acreditam que estavam fazendo a coisa certa.