quinta-feira, 29 de abril de 2010

P32 Parado na parede

Quase caiu...
Toda casa tem uma hora para cair, dependendo do que fazem seus ocupantes. No caso da casa do Brasil, a parede rachada foi um alerta visível para quem não queria sentir o peso dos escombros sobre si. No episódio todo, o peso de uma votação favorável à revisão da Lei da Anistia.

É compreensível a visão jurídica do juiz Eros Grau, que pelo comentário de juristas fez um parecer bem construído sobre seu voto contra a revisão da dita lei. Ele mesmo tendo passado por maus momentos durante a época do regime militar, fundamentou bem sua decisão, mas convenhamos, a parede rachada fez os juízes relatarem em coro seus votos contrários a essa revisão pretendida pela OAB, que como sempre só aparece para colher ou tentar colher louros de coisas que não faz ou se faz, é porque acabarão lhe dando algum lucro, seja ele político ou lucro mesmo, como se entende.

A mesma OAB que chora lágrimas e mais lágrimas por torturados e desaparecidos da época do regime militar mas que não dá grande importância para os milhares de presos do Brasil de hoje, que de forma incompreensível permanecem presos em condições que são uma verdadeira reedição dos campos de concentração nazistas e nem para os incontáveis desaparecidos e torturados pelos soldados do tráfico de drogas, que segundo ela desfrutam de plena democracia e cidadania, mas esses são pobres e favelados, então não tem dinheiro para pagar a tabela de honorários que a OAB estipula para os advogados e sendo assim esses não interessam.

O que comove mesmo a OAB são os antigos esquerdistas oriundos das classes média ou rica das décadas de 60 e 70, que embarcaram na tentativa de derrubar o regime apostando que se isso acontecesse seriam os donos do Brasil, com direito a todos os privilégios do comitê central da nova república soviética dos trópicos. No fundo era uma jogada de cassino do tipo tudo ou nada. Deu em nada, mas após ocuparem cargos legislativos depois da anistia, votaram uma lei de milionárias indenizações para eles mesmos. Enfim, não perderam todas as fichas. Já para as vítimas de seus atentados, nada, nenhum socorro, a não ser o esquecimento, providenciado pelos seus antigos companheiros agora jornalistas.

Quem se lembra de algum jornalista ex-esquerdista entrevistando os mutilados, as viúvas e órfãos que restaram dos seus atentados e assaltos para escrever um livro sobre eles? Ninguém. Aliás, a esquerda brasileira sempre chamou os assaltos a banco de "expropriações". Assassinatos como o do tenente Alberto Mendes Júnior, morto a coronhadas enquanto estava amarrado por Carlos Lamarca e sua turma, eram chamados de "justiçamento por tribunal revolucionário". Explodir uma bomba como fizeram no aeroporto de Guararapes em 1966, matando 2 pessoas e ferindo 15 com gravidade é descrito pelos seus partidários como "ação política".

E a entrada deles nessa situação no passado, acima de tudo foi forçada pelas circunstâncias. Era um charme posar de comunista para discursos nos diretórios acadêmicos até que a Revolução de 1964 colocou tanques nas ruas e de uma hora para outra quem estava com bandeirinha vermelha ficou sem ter para onde ir, já que os diretórios fecharam as portas e largaram todo mundo levando porretada lá fora. Boa parte da mística criada sobre os antigos "guerrilheiros da democracia" se baseia numa visão falseada da história.

Os mesmos "guerrilheiros" que em tempos idos diziam combater o imperialismo norte-americano e ao mesmo tempo defender o povo e a nação brasileira, quem diria, depois de soltos das prisões, aos poucos tornaram-se membros do governo, entregaram o patrimônio nacional nas privatizações ao mesmo capital que para eles era corrupto, tornaram-se banqueiros, donos de corretoras de valores e hoje vivem aos abraços com os mais ricos especuladores internacionais, antes por eles considerados inimigos mortais.
Quando uma parede racha, quem está por perto ouve o barulho que é perceptível. Em 31 de março de 2009 os militares fizeram uma comemoração pelos 45 anos da revolução de 1964, um claro sinal de discordância aberta por muitas coisas vistas na vida nacional. Neste ano, quando a OAB já dava como certa a revisão da lei, em 03 de abril o General Leônidas Pires Gonçalves deu uma entrevista ao repórter Genetton Moraes Neto na GloboNews onde de forma clara deu a entender que o período vivido pela nação foi o enfrentamento de um regime contra opositores que radicalizaram suas ações com a execução generalizada de atentados, sequestros e assassinatos.

Uma frase marcante do general para o repórter foi:

- Quem começa a guerra não pode lamentar mortes. É duro de ouvir?

Seja lá como for, é mais do que claro que se era para ouvir alguma coisa, todos os interessados ouviram e muito bem nos silêncios da entrevista, assim como se lê nas entrelinhas. O mesmo general que já havia acusado os antigos esquerdistas de revanchismo, falava de novo e de forma incisiva nesta data. O mesmo general que havia garantido a posse de José Sarney em 1985 após a doença e morte de Tancredo Neves, afastando todas as especulações e incertezas do cenário de então, deixava uma certeza no ar, a de que as Forças Armadas jamais se submeteriam a uma ofensa dessas, que estava para ser julgada.

A OAB e seus discursantes oportunistas de sempre perderam mais uma vez o rumo. Parar o julgamento era impossível, sair o resultado que queriam seria uma temeridade. E agora? No fundo, aliviados por perderem a própria causa, depois da votação colocaram algumas palavras de lamentações sobre a votação, nobreza de seus propósitos e coisas do tipo. A grande lamentação no entanto era a de que a torneira de novas e milionárias indenizações fora fechada de vez e junto com ela polpudos honorários, fora o aparecimento de novos e falsos heróis, enrolados na bruma do tempo e de mistificações, essa é a verdade.
Fica assim, com a votação do STF negando a revisão da lei, a certeza de que no fundo, não só seus juizes, mas também a já assustada platéia de políticos e antigos esquerdistas, inquietos com a perda de controle do alegre bloco jurídico-carnavalesco da OAB indo de encontro à parede trincada, ia dessa vez provocar a queda da casa.

Para alívio dos antigos "guerrilheiros da democracia" que uma vez haviam ficado trancados de fora da faculdade com suas bandeirinhas vermelhas, afinal o bloco jurídico ficou parado na parede, antes que a parede e junto com ela toda a casa do Brasil caísse em cima de todos.

Mas com trincas assim, não há casa que resista. Logo acaba caindo.

terça-feira, 13 de abril de 2010

P31 O grande truque

De volta ao teatro...
Confesso ao poucos e benvindos amigos leitores que estive ausente neste grande teatro político, a dormir e sonhar tal qual um dissidente russo da antiga União Soviética, enquanto os outros assistiam ávidamente ao pobre e triste espetáculo que se desenrola em nossa frente. Mais outro espetáculo encenado pelos nossos podres três poderes, a exemplo do que também ocorria no finado estado comunista, então chamado de paraíso dos trabalhadores. Sonhavam os dissidentes russos que entravam numa embaixada estrangeira e algum tempo depois estavam livres em outras terras. Livres de toda aquela farsa política. Infelizmente as embaixadas eram cercadas pelos agentes da polícia política formando um árquipelago diplomático, enquanto os russos tentavam se manter à tona no mar em volta. Restava-lhes apenas o árquipelago Gulag, o complexo de prisões soviéticas tão bem denunciado por Alexander Solzhenitzyn.

Vendo as encenações políticas destes tempos, me lembro da citação de um autor sobre o que ele chamava de "monótono desfile de mediocridades" já na década de 70, analisando a baixeza executiva, legislativa e judiciária que entre nós impera.

Despertei bem a tempo de ver o mais recente número de mágica, lamentável por sinal, para encerrar a última peça de teatro do rebolado, onde um assim denominado governador de um chamado distrito federal terminou preso depois de rebolar em meio a denúncias, vídeos e prisões de auxiliares. Enquanto ele representava a peça, outros artistas, travestidos de membros do judiciário e do legislativo lhe deram voz de prisão e o colocaram numa confortável jaulinha onde reluzia a placa "Cadeia" , mas que de cadeia não tinha nada.

Enquanto isso, uma trupe de palhaços entrava no palco gritando elogios aos juízes que estendiam as mãos para serem beijadas. Com as plaquinhas onde se lia "Cidadãos" pregadas em suas testas, os palhaços diziam em voz alta e discursos pungentes que uma nova época se iniciava na política do Brasil, que agora os poderosos estavam indo para a cadeia e voltavam a pular enquanto os juízes diziam estar do lado do clamor popular e depois num canto do palco passavam álcool nas mãos. Beijos do povo, cruzes, que nojo.

Voltei a dormir e acabei acordando algum tempo depois com a encenação da libertação do agora ex-governador, saindo da jaulinha e levado por sua mulher para o conforto do lar e de um ostracismo político, que será regado pelo rico dinheiro público que ele amealhou durante esse tempo todo.

Percebi que tudo havia sido um truque de mágica. Um grande truque. Título mais do que adequado de um filme que vi há pouco tempo e que cai como uma luva para esse teatro do absurdo que temos aqui no Brasil, onde o executivo, o legislativo e o judiciário dançam num infame teatrinho pornô e se pretendem membros de uma grande companhia de teatro a interpretarem de forma virtuosa peças memoráveis da história política.

Enquanto a platéia aqui embaixo aplaude, numa parte dos camarotes os proprietários do teatro se comprazem em ver que tudo sai de acordo com o roteiro. Enquanto isso, na parte superior, os jornalistas estrangeiros encarregados de mandarem suas críticas para os principais jornais do mundo deixam de rir para lamentar a má sorte dos brasileiros abaixo deles, expostos a essas iniquidades que em suas terras faz parte de um secular passado, quando o mesmo tipo de proprietários foi derrubado dos camarotes junto com esses teatros que vieram abaixo em meio a revoluções que de teatrais não tinham nada.

Foi tudo um grande truque. Como diz o velho fabricante de aparelhos de mágica no filme, todo grande truque se divide em três grandes atos. O primeiro chama-se a promessa. O mágico mostra um objeto comum, mas claro, provavelmente não é. Todos sabem que os objetos supostamente comuns mostrados pelo mágico para a platéia são cheios de compartimentos falsos, lugares onde se pode colocar ou tirar alguma coisa que ninguém viu no palco. Basta um ato de prestidigitação. Enquanto os olhares se dirigem para um lugar, a mágica é feita em outro.

O segundo ato chama-se a virada. O mágico pega o objeto comum e o transforma em algo extraordinário.

No truque o mágico mostrou um governador corrupto sendo preso. Em outros países isso é menos que comum. É simplesmente a aplicação da lei e de costumes seculares de probidade e justiça. Aqui no palco político do Brasil, é algo tão incomum que a platéia aplaude mesmo.

A terceira parte chama-se o grande truque e é onde tudo acontece. A platéia vê algo que nunca viu antes.

No caso, na semelhança dos truques dos grandes mágicos enfiados algemados em caixas cheias de cadeados onde deveriam ficar para sempre e saem num instante, nesse caso o mágico mostra o ex-governador saindo de uma caixa política parecida sem problemas.

Tal qual os mágicos para os quais não existe cadeia, cela ou algema que prenda para sempre, bastou uma prestidigitação politico-judiciária para que ele saísse livre. Verdade que agora exposto e notório pela reincidência do que a associação dos mágicos do Brasil chama de crimes, vê-se ele compelido a abandonar o palco, mas não sem antes fazer um último ato de mágica.

O de manter em seu bolso todo o ouro público desaparecido dos cofres de sua administração sem dar contas disso e retirando-se para uma aposentadoria, que se não era desejada, ao menos é forrada de dinheiro.

Dinheiro dos mesmos palhaços que retiram suas placas de "Cidadãos" da cabeça e colocam sobre elas, tal qual coroas, as orelhas de burro que o assistente de palco lhes entrega para o próximo ato.

Olho para as portas do teatro sempre fechadas e penso em dormir de novo.