domingo, 15 de maio de 2011

P69 A foto que você não pode ver

Fotos formam opiniões quando são mostradas...ou até mesmo escondidas...
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Não é intenção minha mostrar fotos de guerra como as que seguem abaixo por descaso com os leitores. As fotos são chocantes, mas retratam o que é uma guerra e o trabalho notável de fotógrafos estrangeiros durante a guerra do Vietnã, uma das piores em que os americanos entraram e que foi talvez a última onde os jornalistas puderam trabalhar sem entraves, mostrando ao seu país e ao mundo o que lá acontecia. Foi um dos últimos acontecimentos onde os militares americanos mantiveram a tradição de mostrar o que acontecia, coisa que faziam desde os tempos da guerra civil americana em 1860.
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Na guerra do Iraque, a censura dos militares americanos é visível. Muitas das fotos mostradas nos dias de hoje vem de jornalistas que escapam dessa censura ou mesmo de cidadãos que registram as cenas e as colocam na Internet, de onde vencem qualquer impedimento. Ameaças de morte dos soldados a jornalistas no Iraque já se tornaram coisa comum. Trabalham quando não intimidados, arriscados a não poderem mostrar o que registraram. Que tipo de soldado procura ocultar o registro das coisas que são feitas? Somente os que sabem que estão cometendo atos, que longe dos combates, podem ser vistos como crimes de guerra.
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A morte de Osama Bin Laden recentemente anunciada com grande propaganda pelo mundo afora, traz junto do que alguns jornalistas proclamaram como uma espetacular vitória, uma atitude estranha mas reveladora do que aconteceu. Alegando que a foto de Bin Laden morto só acirraria o ódio dos radicais islâmicos contra os americanos, a Casa Branca mesmo tendo assistido a tudo em áudio e vídeo transmitidos ao vivo e a cores pelos soldados americanos, achou que o melhor a fazer seria ocultar tudo o que foi gravado. Todo o meticuloso registro de imagens e palavras ficou, por enquanto, para sempre oculto, sendo liberadas apenas algumas fotos de parentes de Bin Laden também mortos.
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Nas grandes cidades da Europa e da América, depois de um momento de júbilo onde os cidadãos deram vazão à sua alegria, todos viram-se subitamente envolvidos por um sentimento de medo. Em Nova Iorque muitos americanos passaram a recusar táxis dirigidos por imigrantes paquistaneses ou indianos. Na Inglaterra coisa parecida também acontece dentro do metrô, onde parar perto de um imigrante indiano provoca desconforto. Na Espanha, a mesma coisa dentro de trens. Algo mais além do secular racismo europeu e americano hoje permeia a vida nessas cidades. Um certo receio desceu como uma névoa, com o sentimento silencioso de que afinal pode haver uma vingança mesmo. 80 cadetes paquistaneses já pagaram a conta pela morte do terrorista, mortos por um suicida que entrou no ônibus que os levava e detonou os explosivos que carregava. Na Europa, na América, quem será o "premiado" por isso tudo? Será que pode acontecer mesmo? Não teria sido melhor terem capturado Bin Laden vivo para um julgamento? Porque estão escondendo tudo? É o novo receio que toma conta de todos, com uma névoa de incerteza baixando sobre as grandes capitais do mundo.
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Abaixo seguem fotos famosas das das guerras onde os americanos entraram e a censura ficou de fora.
1965. A revista Life mostra a foto de um prisioneiro do exército americano sendo levado para interrogatório. Geralmente eram entregues aos militares sul-vietnamitas, que além da tortura costumavam executá-los sumariamente. Os leitores do mundo puderam saber de tudo isso.
1967. Um coronel do exército sul-vietnamita executa a queima-roupa um suspeito de ser terrorista, durante combates de rua em Saigon. A foto provocou tal comoção na América que iniciou os protestos da população contra a guerra. O mundo todo viu essa foto.
1968. Homens, mulheres e crianças sul-vietnamitas da aldeia de My Lai executados por soldados americanos, num massacre que marcou o exército americano para sempre. A população dividiu-se completamente, com a maioria exigindo o fim da guerra. Jovens americanos chamados para o serviço militar passaram a fugir para o Canadá.
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Abaixo, fotos da guerra do Iraque, cuja invasão final aconteceu em 2003 e onde a censura entrou junto com as tropas.
Guerra do Iraque, sem data. Soldado americano socorre colega gravemente ferido após combates com os insurgentes iraquianos. Apesar da máquina militar americana ser de uma potência esmagadora, estão longe de terem tornado o Iraque seguro. O grande receio dos censores militares é o aumento do questionamento da guerra.
Prisão de Abu Ghraib no Iraque, sem data. Militar americano tortura prisioneiro iraquiano, atiçando um cão de guarda contra ele. As demais fotos, levadas para fora de forma clandestina deixaram não só o governo como o exército americano em situação insustentável. O mundo todo viu.
Guerra do Iraque, sem data. Embarque dos corpos de soldados americanos mortos no Iraque. Com uma média de 3 mortes por dia, com os atentados e combates tipo guerrilha efetuados pelos insurgente iraquianos, o exército americano não tem como proclamar uma vitória definitiva. Censores militares procuram evitar fotos assim, mas não tem como impedir que os próprios soldados façam as fotos.
Guerra do Iraque, sem data. Criança iraquiana morta após ação das forças americanas é carregada por um morador local. Os censores militares sabem do impacto e questionamentos que fotos assim levantam. Mas o mundo acaba vendo.
Osama Bin Laden, sem data. Em local ignorado, vivo e por vezes aparecendo em vídeos exortando seus seguidores a continuarem com atentados pelo mundo, onde pudessem atingir os americanos e seus aliados. Fotos e vídeos assim o governo americano sempre fez questão de mostrar e difundir da forma mais completa possível. Justificava qualquer guerra.
O quadro negro acima seria a foto de Osama Bin Laden morto em 02 de maio de 2011, em sua casa em Abottabad, no Paquistão. Não faltam informações de data, hora e local, tudo fornecido pelos comunicados do governo americano após terem anunciado ao mundo o feito. Segundo o porta-voz da Casa Branca, as tropas especiais transmitiram ao vivo para o presidente americano e seus assessores toda a ação, do momento da chegada, invasão e morte de Bin Laden, até o momento em que decolaram com o corpo dele. Dos 40 minutos filmados da ação, um só segundo que fosse mostraria a imagem de Osama Bin Laden morto.
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Mas segundo a Casa Branca, a foto teria o efeito de acirrar o ódio dos radicais e seria uma visão chocante para as pessoas do mundo todo. Depois de tudo que o mundo já viu e continua vendo das guerras passadas e da guerra atual, nenhuma outra justificativa poderia ser tão desastrada e tão forçada.
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Porque tendo sido filmada toda a operação, ao verem a foto de Bin Laden morto, jornalistas e o público passariam a exigir a curta sequência dos momentos em que Bin Laden estava para entrar na linha de tiro e de quando foi atingido.
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Alguns jornalistas também iriam querer algumas cenas dos momentos em que os helicópteros militares chegaram e aterrissaram no quintal da casa dele. Apenas para verem como tudo isso, todo esse barulho não despertou a atenção das sentinelas da academia militar próxima da casa de Bin Laden. Helicópteros, tropas de assalto, tudo isso durante 40 minutos e toda uma academia militar dormia como se nada acontecesse. É mesmo intrigante.
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Com a narrativa já pública de que uma das mulheres de Bin Laden teria entrado em sua frente tentando protegê-lo, fica mais do que claro que ele poderia ter sido capturado vivo e levado para julgamento. As revelações que ele poderia fazer sobre seus contatos no Ocidente, bancos que movimentaram seu dinheiro para uso de seus agentes, compras de material bélico com mercadores de armas, movimentações de serviços secretos, tudo isso poderia trazer verdades atordoantes.
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E com todas as possibilidades de tantas revelações, o mesmo soldado supertreinado que o colocou na linha de tiro do seu fuzil, não hesitou em matá-lo.
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Osama Bin Laden, a testemunha mais arrasadora de tudo o que aconteceu desde 11 de setembro de 2001 morreu assim. As tropas especiais que são treinadas para tomarem de assalto o esconderijo de um terrorista e levá-lo preso para interrogatório e julgamento desta vez fizeram outra coisa. Junto com o corpo de Bin Laden, jogaram no fundo do mar todas as verdades que ele conhecia.

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É só examinar a ação como um conjunto de decisões do alto comando militar e político americano e as conclusões e opiniões marcam o que foi decidido com uma cor de suspeita, numa ação que se nota claramente que foi mais uma queima de arquivo do que uma tentativa de prisão.

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