segunda-feira, 25 de maio de 2009

P16 Onde moras?

Na rua e na praia...


Sempre presente ou pelo menos fazendo de conta que está presente na vida nacional em favor dos excluidos, a Igreja Católica mostra enfim que é mais uma das instituições que estão aí para lucrar. Perdoem-me os católicos se pareço um opositor. Não sigo nenhuma religião, o que me livra da suspeita de ser de outra igreja. E sem dúvida existem os padres que realmente encarnam a figura do autêntico missionário, que passa a vida como humilde pregador e socorrista dos pobres e desamparados. E ainda por cima, filósofos. Um exemplo inesquecível é o da vida do Padre Teilhard de Chardin.

Infelizmente ou felizmente talvez, seus sucessores, em especial os do Brasil, vieram a mostrar que a antiga caixinha de esmolas virou um enorme portfólio de investimentos, usando a linguagem dos corretores da bolsa de valores. Ao que parece, de algum tempo para cá, pelo menos já em público mesmo, a Igreja Católica decidiu mostrar sem contrangimentos que aderiu aos valores, não os ditos espirituais, mas àqueles valores que são mostrados nos painéis luminosos da Bolsa de Valores.

Não pode ser outra a conclusão ao sabermos que o ecônomo da Arquidiocese do Rio de Janeiro comprou com dinheiro da Igreja, pois parece pouco provável que seu salário desse para isso, um apartamento 500 m² de frente para a praia por 2 milhões de reais numa das regiões mais caras do Rio de Janeiro. O ecônomo padre Edvino Steckel que efetuou a compra foi afastado de suas funções, mas o ex-arcebispo do Rio de Janeiro, D. Eusébio Scheid que agora reside em São José dos Campos, poderá usar o imóvel quando viajar para o Rio de Janeiro.

Até lá os paroquianos do Rio de Janeiro terão a alegria de saber que recebem umas das hóstias mais caras do mundo, afinal é com elas que se pagam as despesas de manutenção do luxuoso apartamento, que ficará à disposição dos altos prelados da Igreja, enquanto que os baixos pelados do povo andarão na frente do apartamento de hóstia na boca bem fechada.

Não parece que os brados eloqüentes que ouvimos nas reuniões dos bispos brasileiros da CNBB, a famosa Conferência Nacional dos Bispos do Brasil acerca dos pobres e excluídos tenham se levantado para condenar a compra do imóvel ou mesmo fazer da Campanha da Fraternidade de 2009 um ato de condenação contra tais absurdos. Padres, bispos, arcebispos e cardeais, que se acham no direito de bradar contra as injustiças do Brasil, não dão uma única declaração sobre o assunto.

Talvez porque a conferência, quem sabe, ainda esteja conferindo o caso todo. Pensando nisso, que largue a primeira pedra quem já viu algum bispo viajando de ônibus para as reuniões da CNBB e que atire a primeira pedra quem já viu algum bispo viajando de avião para a mesma reunião. Vai ser uma verdadeira artilharia antiaérea de pedras.


De toda forma, perde a cada dia com os escândalos envolvendo finanças e sexo, um pouco mais da aura que um dia pretendeu ter, essa pretensa igreja de defesa dos pobres e excluídos. Não que tais coisas sejam exclusividade da Igreja Católica, mas que dão uma idéia da inversão de valores a que ela se submeteu, dão sim.


As campanhas da fraternidade sempre tiveram um cartaz escolhido a dedo pelos bispos do Brasil. O cartaz da campanha de 2009 traz o seguinte lema "A paz é fruto da justiça". Assim cabe uma pergunta para os bispos da CNBB. É justo num país como o Brasil, tão carente de moradias dignas, que sua igreja gaste 2 milhões de reais para comprar um apartamento de luxo para um de seus membros?


Pior ainda, relembrando que a CNBB sempre deu opiniões sobre tudo na vida nacional, sempre sob a diretriz de defender os pobres e excluídos, apontando os pecados de todos, devia ela comentar e condenar de forma eloqüente esse caso, mas parece que no caso dos pecados da Igreja a diretriz é outra.

Ou então poderiam os bispos recolherem-se na leitura desta passagem na Bíblia, em Mateus capítulo 7, versículo 4: "Ou como podes dizer a teu irmão: 'Permite-me tirar o argueiro do teu olho, quando eis que há uma trave no teu próprio olho? Hipócrita. Tira primeiro a trave do teu olho e depois verás claramente como tirar o argueiro do olho do teu irmão'."

Mais ironicamente, relembrando o passado, o cartaz da campanha da fraternidade de 1993 mostrava um casal sem teto, com a mulher grávida, à sombra de uma casa, com o lema "Onde moras?".


Agora o casal já sabe onde mora. Na rua da desilusão, com a reunião da CNBB em silêncio de um lado da rua e o luxuoso apartamento do ex-arcebispo do outro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário