domingo, 6 de junho de 2010

P35 Lembranças de uma guerra

Túnel do tempo e do medo...

Uma palavra ao leitor : hoje nesse mundo interconectado, os cidadãos comuns podem opinar sobre os fatos que ocorrem nesse imenso mural eletrônico da Internet. Sobre as coisas que Israel tem feito no Oriente Médio as opiniões convergem numa condenação geral. Seria bom que israelenses e palestinos pudessem viver em paz. Pesquisando a história do mundo, quase não há menções aos palestinos antes de 1948. Depois de expulsos pelos judeus de sua terra, começaram a aparecer como combatentes dos quais Israel na verdade tem medo. Tem força militar para contê-los, mas vive em constante medo. Os palestinos antes esquecidos pelos historiadores hoje apenas devolvem o que recebram. E os judeus colhem o que plantaram. É o que veremos nessa retrospectiva de textos.
Texto publicado originalmente em 05.01.09 - http://vellker.blog.terra.com.br/

Uma guerra distante

Por esses dias vemos uma guerra distante acontecendo. Os ataques maciços de Israel contra a população palestina na faixa de Gaza são uma das grandes tragédias destes tempos. E também, há coisa de alguns anos vem o governo do Brasil, desde os tempos de Fernando Henrique Cardoso e hoje nas palavras do presidente Lula, sendo insistente na idéia de ter uma assento no Conselho de Segurança da ONU.

Isso é coisa para gente grande. No cenário mundial, em outras palavras, é coisa para quem pode se defender, para quem tem um poder militar capaz de impor verdadeiro respeito. Se não é capaz de defender nem a sua própria nação, devia o governo brasileiro parar com esses inúteis pretensões que só provocam o riso dos atuais detentores desse poder, a saber Estados Unidos, Rússia, Inglaterra, França e China que mantém exércitos e uma força nuclear que realmente contam.

No caso do Brasil, é válida tal pretensão desde que não só a nação seja um poder militar respeitável, como também sua população deve ser capaz de opinar sobre os conflitos do mundo, sabendo que ao mesmo tempo é efetivamente capaz de intervir se necessário.

Sendo assim, ainda acompanhando as notícias que vem da região de Gaza, decidi repostar o texto que escrevi na época dos ataques de Israel contra o Líbano no ano de 2006. Se queremos mesmo fazer parte de algum conselho que decida sobre segurança, devemos no mínimo ser capazes de discorrer sobre o assunto. E termos a certeza de que todos ficam em silêncio para ouvirem o que temos dizer. Mais importante ainda, que nossa decisão faça diferença não só sendo acatada, mas também pelo que a nação decida fazer.

Atrás disso haverá um poder militar autenticamente nacional que realmente será capaz de sustentar nossa decisão.

E esse é e sempre será, como sabemos, um assunto polêmico e que desperta simpatias e antipatias. A outra forma de encarar isso que acontece é fazermos de conta que não vivemos nesse planeta chamado Terra. Coisa que Israel vem fazendo há 60 anos.

O ataque de Israel, o Dia dos Pais sob fogo. Um cessar fogo anunciado...e lembranças...de sentimentos do Dia dos Pais, no Líbano...
Pais e filhos se encontravam naqueles dias. Ou pais e filhos eram levados uns aos outros...

Alguns pais recebiam telefonemas de parabéns. E depois disparavam canhões de 175 mm. Alvos a 25 kms. de distância. Outros recebiam mensagens de carinho a 6 kms. de altura, voando a 800 kms. por hora. E depois soltavam bombas de 500 kg.

A 25 kms. de distância...a 6 km. de altura...esses homens, pais também, não viram o que acontecia depois. Como reagiriam se vissem...?

Chegam as notícias de violação do cessar-fogo por parte de Israel. Ehud Olmert, primeiro ministro de Israel que comanda toda essa máquina militar apresenta desculpas.

Passando mais um sentimento de tédio do que um sentimento de angústia, com uma voz sem nenhuma alteração. Ele realmente comanda essa máquina? Israel realmente controla essa máquina?

Ou ela se move sozinha? Ou recebe equipamentos, combustíveis, peças e tudo o que precisa de fora de Israel? E ordens também...?

Links a verificar:
Tropas de Israel violam o cessar-fogo

sexta-feira, 4 de junho de 2010

P34 A diáspora

O futuro dentro de um labirinto... Na foto tirada nas primeiras incursões de Israel na Faixa de Gaza em 2008, um adolescente palestino atira uma pedra contra um tanque israelense.

Hoje o Estado de Israel segue um triste destino, que na verdade foi escolhido por ele mesmo. Apoiado por seu povo, com poucas vozes discordantes, vivem, Estado e povo, uma nova diáspora dentro da própria terra para onde retornaram em 1948. Encontraram de tudo, menos paz. E com essa forma de pensar, jamais encontrariam a paz mesmo.

Hoje o caminho da terra prometida tornou-se uma caminhada sem fim num labirinto.

E com o pensamento de ódio e destruição voltado aos povos em sua volta, esse povo e esse Estado estarão condenados a trilharem esse caminho dentro de suas próprias fronteiras, um caminho de ódio, destruição e medo de tudo e de todos.

Com os acontecimentos recentes, onde Israel atacou navios de ativistas que pretendiam romper o bloqueio que exercem contra a população palestina, é necessária uma reedição de textos já escritos, que fazem uma reflexão sobre a atitude do Estado de Israel.

Que para ter poder, preferiu abandonar toda a esperança de um futuro de paz.

Abandonou a esperança da mesma forma que a abandonavam os que entravam no inferno de Dante.

domingo, 23 de maio de 2010

P33 Marina e o muro

Migalhas por cima do muro...
Na semana que passou, obedecendo a mais pura tradição política brasileira, veio a senadora Marina Silva mostrar ao futuros vencedores da próxima eleição presidencial que estará do lado do vencedor, seja ele de que partido for, ao mesmo tempo em que faz de conta que está do lado do povo, já que na última briga que teve com o governo do presidente Lula, perdeu o cargo de ministra e entrou para o Partido Verde, que últimamente pelas suas atitudes já parece mais verde da cor do dólar americano que dizem repudiar do que da bandeira que dizem representar. Mas isso tudo é dito em público é claro. Já nos bastidores a cor é outra.

Com seu discurso, a ex-ministra deixou claro a todos que participam da corrida presidencial, que é dando que se recebe e deu para todos que ainda tinham alguma dúvida a certeza de que como outras antigas figuras políticas que se diziam do lado da moralidade, ela tem a moralidade no mesmo conceito do látex tirado dos seringais da sua tão lamentada Amazônia. É apenas matéria prima para fazer a moralidade política brasileira que se estica como queira o freguês.

Em discurso inflamado Marina Silva defendeu as privatizações feitas no governo FHC, dizendo que é muito bom ter um telefone hoje na hora que quiser e que se faltou tranparência nas privatizações e a população pagou o prejuízo, ora afinal hoje ela pode comprar um telefone de poucos reais na hora em que quiser, enquanto as operadoras estrangeiras remetem a seus países bilhões de reais por mês. Não é muita coisa segundo ela, aliás é coisa para nem ser levada em conta. Analisado com mais atenção, o discurso da senadora deixa entrever em suas linhas como uma boa dose de demagogia com o eleitorado e submissão a estrangeiros ajuda a subir na política brasileira ou melhor dizendo, ajuda a pular o muro que deixa o povo de um lado e os jardins da casa grande intocados de outro. Ao que parece a senadora Marina Silva não prestou atenção num detalhe.

No início das privatizações Sérgio Mota estimava a venda da Telebrás em 60 bilhões de reais, depois de sua morte deixaram por 13 bilhões e no final saiu tudo por 8 bilhões de reais. A única coisa que as empresas estrangeiras fizeram foi se apossar dos milhões de quilômetros de cabos telefonicos instalados, centenas de centrais telefônicas e funcionários treinados, que demitiram para readmitir pela metade do salário, enquanto tinham todas as vantagens de financiamentos para a instalação de tecnologia que tornou o sistema de telecomunicações brasileiro totalmente dependente dos estrangeiros. Os bancos públicos que foram vendidos seguiram o mesmo modelo. Em todos os casos, o governo brasileiro, leia-se o cidadão que paga os impostos arcou com o passivo das empresas, enquanto que as empresas estrangeiras ficaram de posse das instalações, dos lucros e das contas bancárias existentes. A Companhia Vale do Rio Doce foi avaliada por empresas estrangeiras, claro, em 3 bilhões de reais. Hoje essas mesmas empresas avaliam a Vale em 90 bilhões de reais. Operadoras de telefonia podem ser obrigadas a devolver 10 bilhões de reais por cobranças indevidas. Geradoras de eletricidade podem ser obrigadas a devolver ao consumidor brasileiro 7 bilhões de reais. Isso consta de reportagens de jornais, rapidamente silenciadas pelas suas editorias, que vivem da verba publicitária dessas mesmas empresas. Afinal, porque é que empresas de telefonia estrangeiras compraram 20% do capital acionário da "Folha de São Paulo"? Existem muitas formas de comprar o silêncio e a cumplicidade. Mas com tudo isso a senadora Marina Silva se sente bem á vontade. Afinal para ela o povo brasileiro pode pagar o prejuízo. Afinal o povo brasileiro paga até o salário dela. Prejuízo por prejuízo até que não incomoda.

Resta ao cidadão brasileiro, com sua moderna central telefônica pela qual paga até 7 vezes mais caro do que cidadãos de outros países que hoje lhe oferecem o mesmo serviço, ligar para algum 0800 estrangeira o para reclamar sobre isso. E ao invés de ficar ouvindo musiquinha, vão colocar algum discurso da senadora Marina Silva para ele ficar ouvindo.

Assim a senadora dá o recado aos candidatos do PT, do PSDB e seus aliados do PMDB e do DEM de que suas capitanias hereditárias não serão tocadas de forma alguma. Aliás, a senadora diz nas entrelinhas em alto e bom som que depois que perdeu o emprego de ministra no governo Lula, se acha aberta a propostas venham elas de que partido vierem. Ou seja, sabendo que sua candidatura é só uma corrida para o prestígio que ainda pode conseguir, ela se declara alinhada e obediente às diretrizes do novo governo, seja ele de quem for. Afinal, quem sabe, isso pode render um ministério, uma secretaria.

Se as privatizações foram afinal um tão bom negócio para o país, é de se perguntar porque a senadora nos seus tempos de ministério não privatizou as áreas públicas da floresta amazônica. Ora, não teria sido melhor? Afinal, mais essa, até mesmo as melhores estradas do Brasil hoje rendem milhões de dólares por mês a americanos e europeus, hoje donos delas. Claro, nenhum deles se interessou em comprar as estradas federais em péssimo estado. Só se interessaram pelas melhores e mais bem conservadas.

Continuando a reforçar seu recado de obediência, a senadora diz que é necessário também cortar os gastos do governo. Isso quer dizer nos bastidores que o alvo dos cortes sãao os gastos da previdência, da saúde e da educação, enquanto uma propaganda milionária é feita dizendo que está tudo às mil maravilhas nessa parte.

É dessa forma que podemos ver nos dias de hoje a falsidade e acima de tudo o horror do jogo político, onde vale tudo, cuspir nos ideais que um dia foram levantados como bandeira, se é que foram ideais de verdade. No fundo era tudo pura demagogia.

A senadora Marina Silva encarna com todas as cores disso a figura do político brasileiro. A de quem promete de tudo aos cidadãos, aos eleitores, desde que a ajudem a pular o muro que separa a casa grande dos políticos da senzala dos cidadãos. Uma vez lá dentro, abrirá os portões para que todos entrem e mudem tudo.

Mas assim que a ajudam a pular o muro, assim que alcança o jardim da casa grande, agora já amiga dos proprietários, ela nada mais faz do que jogar algumas migalhas do bolo por cima do muro.

Delfim Neto com sua idéia de repartir o bolo depois que ele crescesse, era bem mais correto.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

P32 Parado na parede

Quase caiu...
Toda casa tem uma hora para cair, dependendo do que fazem seus ocupantes. No caso da casa do Brasil, a parede rachada foi um alerta visível para quem não queria sentir o peso dos escombros sobre si. No episódio todo, o peso de uma votação favorável à revisão da Lei da Anistia.

É compreensível a visão jurídica do juiz Eros Grau, que pelo comentário de juristas fez um parecer bem construído sobre seu voto contra a revisão da dita lei. Ele mesmo tendo passado por maus momentos durante a época do regime militar, fundamentou bem sua decisão, mas convenhamos, a parede rachada fez os juízes relatarem em coro seus votos contrários a essa revisão pretendida pela OAB, que como sempre só aparece para colher ou tentar colher louros de coisas que não faz ou se faz, é porque acabarão lhe dando algum lucro, seja ele político ou lucro mesmo, como se entende.

A mesma OAB que chora lágrimas e mais lágrimas por torturados e desaparecidos da época do regime militar mas que não dá grande importância para os milhares de presos do Brasil de hoje, que de forma incompreensível permanecem presos em condições que são uma verdadeira reedição dos campos de concentração nazistas e nem para os incontáveis desaparecidos e torturados pelos soldados do tráfico de drogas, que segundo ela desfrutam de plena democracia e cidadania, mas esses são pobres e favelados, então não tem dinheiro para pagar a tabela de honorários que a OAB estipula para os advogados e sendo assim esses não interessam.

O que comove mesmo a OAB são os antigos esquerdistas oriundos das classes média ou rica das décadas de 60 e 70, que embarcaram na tentativa de derrubar o regime apostando que se isso acontecesse seriam os donos do Brasil, com direito a todos os privilégios do comitê central da nova república soviética dos trópicos. No fundo era uma jogada de cassino do tipo tudo ou nada. Deu em nada, mas após ocuparem cargos legislativos depois da anistia, votaram uma lei de milionárias indenizações para eles mesmos. Enfim, não perderam todas as fichas. Já para as vítimas de seus atentados, nada, nenhum socorro, a não ser o esquecimento, providenciado pelos seus antigos companheiros agora jornalistas.

Quem se lembra de algum jornalista ex-esquerdista entrevistando os mutilados, as viúvas e órfãos que restaram dos seus atentados e assaltos para escrever um livro sobre eles? Ninguém. Aliás, a esquerda brasileira sempre chamou os assaltos a banco de "expropriações". Assassinatos como o do tenente Alberto Mendes Júnior, morto a coronhadas enquanto estava amarrado por Carlos Lamarca e sua turma, eram chamados de "justiçamento por tribunal revolucionário". Explodir uma bomba como fizeram no aeroporto de Guararapes em 1966, matando 2 pessoas e ferindo 15 com gravidade é descrito pelos seus partidários como "ação política".

E a entrada deles nessa situação no passado, acima de tudo foi forçada pelas circunstâncias. Era um charme posar de comunista para discursos nos diretórios acadêmicos até que a Revolução de 1964 colocou tanques nas ruas e de uma hora para outra quem estava com bandeirinha vermelha ficou sem ter para onde ir, já que os diretórios fecharam as portas e largaram todo mundo levando porretada lá fora. Boa parte da mística criada sobre os antigos "guerrilheiros da democracia" se baseia numa visão falseada da história.

Os mesmos "guerrilheiros" que em tempos idos diziam combater o imperialismo norte-americano e ao mesmo tempo defender o povo e a nação brasileira, quem diria, depois de soltos das prisões, aos poucos tornaram-se membros do governo, entregaram o patrimônio nacional nas privatizações ao mesmo capital que para eles era corrupto, tornaram-se banqueiros, donos de corretoras de valores e hoje vivem aos abraços com os mais ricos especuladores internacionais, antes por eles considerados inimigos mortais.
Quando uma parede racha, quem está por perto ouve o barulho que é perceptível. Em 31 de março de 2009 os militares fizeram uma comemoração pelos 45 anos da revolução de 1964, um claro sinal de discordância aberta por muitas coisas vistas na vida nacional. Neste ano, quando a OAB já dava como certa a revisão da lei, em 03 de abril o General Leônidas Pires Gonçalves deu uma entrevista ao repórter Genetton Moraes Neto na GloboNews onde de forma clara deu a entender que o período vivido pela nação foi o enfrentamento de um regime contra opositores que radicalizaram suas ações com a execução generalizada de atentados, sequestros e assassinatos.

Uma frase marcante do general para o repórter foi:

- Quem começa a guerra não pode lamentar mortes. É duro de ouvir?

Seja lá como for, é mais do que claro que se era para ouvir alguma coisa, todos os interessados ouviram e muito bem nos silêncios da entrevista, assim como se lê nas entrelinhas. O mesmo general que já havia acusado os antigos esquerdistas de revanchismo, falava de novo e de forma incisiva nesta data. O mesmo general que havia garantido a posse de José Sarney em 1985 após a doença e morte de Tancredo Neves, afastando todas as especulações e incertezas do cenário de então, deixava uma certeza no ar, a de que as Forças Armadas jamais se submeteriam a uma ofensa dessas, que estava para ser julgada.

A OAB e seus discursantes oportunistas de sempre perderam mais uma vez o rumo. Parar o julgamento era impossível, sair o resultado que queriam seria uma temeridade. E agora? No fundo, aliviados por perderem a própria causa, depois da votação colocaram algumas palavras de lamentações sobre a votação, nobreza de seus propósitos e coisas do tipo. A grande lamentação no entanto era a de que a torneira de novas e milionárias indenizações fora fechada de vez e junto com ela polpudos honorários, fora o aparecimento de novos e falsos heróis, enrolados na bruma do tempo e de mistificações, essa é a verdade.
Fica assim, com a votação do STF negando a revisão da lei, a certeza de que no fundo, não só seus juizes, mas também a já assustada platéia de políticos e antigos esquerdistas, inquietos com a perda de controle do alegre bloco jurídico-carnavalesco da OAB indo de encontro à parede trincada, ia dessa vez provocar a queda da casa.

Para alívio dos antigos "guerrilheiros da democracia" que uma vez haviam ficado trancados de fora da faculdade com suas bandeirinhas vermelhas, afinal o bloco jurídico ficou parado na parede, antes que a parede e junto com ela toda a casa do Brasil caísse em cima de todos.

Mas com trincas assim, não há casa que resista. Logo acaba caindo.

terça-feira, 13 de abril de 2010

P31 O grande truque

De volta ao teatro...
Confesso ao poucos e benvindos amigos leitores que estive ausente neste grande teatro político, a dormir e sonhar tal qual um dissidente russo da antiga União Soviética, enquanto os outros assistiam ávidamente ao pobre e triste espetáculo que se desenrola em nossa frente. Mais outro espetáculo encenado pelos nossos podres três poderes, a exemplo do que também ocorria no finado estado comunista, então chamado de paraíso dos trabalhadores. Sonhavam os dissidentes russos que entravam numa embaixada estrangeira e algum tempo depois estavam livres em outras terras. Livres de toda aquela farsa política. Infelizmente as embaixadas eram cercadas pelos agentes da polícia política formando um árquipelago diplomático, enquanto os russos tentavam se manter à tona no mar em volta. Restava-lhes apenas o árquipelago Gulag, o complexo de prisões soviéticas tão bem denunciado por Alexander Solzhenitzyn.

Vendo as encenações políticas destes tempos, me lembro da citação de um autor sobre o que ele chamava de "monótono desfile de mediocridades" já na década de 70, analisando a baixeza executiva, legislativa e judiciária que entre nós impera.

Despertei bem a tempo de ver o mais recente número de mágica, lamentável por sinal, para encerrar a última peça de teatro do rebolado, onde um assim denominado governador de um chamado distrito federal terminou preso depois de rebolar em meio a denúncias, vídeos e prisões de auxiliares. Enquanto ele representava a peça, outros artistas, travestidos de membros do judiciário e do legislativo lhe deram voz de prisão e o colocaram numa confortável jaulinha onde reluzia a placa "Cadeia" , mas que de cadeia não tinha nada.

Enquanto isso, uma trupe de palhaços entrava no palco gritando elogios aos juízes que estendiam as mãos para serem beijadas. Com as plaquinhas onde se lia "Cidadãos" pregadas em suas testas, os palhaços diziam em voz alta e discursos pungentes que uma nova época se iniciava na política do Brasil, que agora os poderosos estavam indo para a cadeia e voltavam a pular enquanto os juízes diziam estar do lado do clamor popular e depois num canto do palco passavam álcool nas mãos. Beijos do povo, cruzes, que nojo.

Voltei a dormir e acabei acordando algum tempo depois com a encenação da libertação do agora ex-governador, saindo da jaulinha e levado por sua mulher para o conforto do lar e de um ostracismo político, que será regado pelo rico dinheiro público que ele amealhou durante esse tempo todo.

Percebi que tudo havia sido um truque de mágica. Um grande truque. Título mais do que adequado de um filme que vi há pouco tempo e que cai como uma luva para esse teatro do absurdo que temos aqui no Brasil, onde o executivo, o legislativo e o judiciário dançam num infame teatrinho pornô e se pretendem membros de uma grande companhia de teatro a interpretarem de forma virtuosa peças memoráveis da história política.

Enquanto a platéia aqui embaixo aplaude, numa parte dos camarotes os proprietários do teatro se comprazem em ver que tudo sai de acordo com o roteiro. Enquanto isso, na parte superior, os jornalistas estrangeiros encarregados de mandarem suas críticas para os principais jornais do mundo deixam de rir para lamentar a má sorte dos brasileiros abaixo deles, expostos a essas iniquidades que em suas terras faz parte de um secular passado, quando o mesmo tipo de proprietários foi derrubado dos camarotes junto com esses teatros que vieram abaixo em meio a revoluções que de teatrais não tinham nada.

Foi tudo um grande truque. Como diz o velho fabricante de aparelhos de mágica no filme, todo grande truque se divide em três grandes atos. O primeiro chama-se a promessa. O mágico mostra um objeto comum, mas claro, provavelmente não é. Todos sabem que os objetos supostamente comuns mostrados pelo mágico para a platéia são cheios de compartimentos falsos, lugares onde se pode colocar ou tirar alguma coisa que ninguém viu no palco. Basta um ato de prestidigitação. Enquanto os olhares se dirigem para um lugar, a mágica é feita em outro.

O segundo ato chama-se a virada. O mágico pega o objeto comum e o transforma em algo extraordinário.

No truque o mágico mostrou um governador corrupto sendo preso. Em outros países isso é menos que comum. É simplesmente a aplicação da lei e de costumes seculares de probidade e justiça. Aqui no palco político do Brasil, é algo tão incomum que a platéia aplaude mesmo.

A terceira parte chama-se o grande truque e é onde tudo acontece. A platéia vê algo que nunca viu antes.

No caso, na semelhança dos truques dos grandes mágicos enfiados algemados em caixas cheias de cadeados onde deveriam ficar para sempre e saem num instante, nesse caso o mágico mostra o ex-governador saindo de uma caixa política parecida sem problemas.

Tal qual os mágicos para os quais não existe cadeia, cela ou algema que prenda para sempre, bastou uma prestidigitação politico-judiciária para que ele saísse livre. Verdade que agora exposto e notório pela reincidência do que a associação dos mágicos do Brasil chama de crimes, vê-se ele compelido a abandonar o palco, mas não sem antes fazer um último ato de mágica.

O de manter em seu bolso todo o ouro público desaparecido dos cofres de sua administração sem dar contas disso e retirando-se para uma aposentadoria, que se não era desejada, ao menos é forrada de dinheiro.

Dinheiro dos mesmos palhaços que retiram suas placas de "Cidadãos" da cabeça e colocam sobre elas, tal qual coroas, as orelhas de burro que o assistente de palco lhes entrega para o próximo ato.

Olho para as portas do teatro sempre fechadas e penso em dormir de novo.

terça-feira, 30 de março de 2010

P30 Construção

Um exemplo a ser lembrado...
Ontem, acessando como sempre o bilogue "Promotor de Justiça" fui lendo os textos novos e percebi que junto do último comentário que eu havia deixado no texto que cita uma obra de Monteiro Lobato havia um comentário a mais. Fui ler para saber da opinião do leitor sobre os personagens que este genial escritor brasileiro criou. Foi uma grata surpresa.

Escreve-me um leitor anônimo da cidade de Sobral no Ceará achando interessante os pontos de vista que deixei no comentário que fiz. Eu o agradeço pelo que disse, mas mais do que isso, seu comentário se tornou para mim tocante pelo que diz, pelas atitudes que toma. É uma verdadeira declaração de coragem, de lucidez e acima de tudo de estoicismo frente às coisas que ele vê e que nós cidadãos de outros pontos desse Brasil também vemos diariamente. Mais do que ver, sofremos no fim das contas.

Morando na periferia de Sobral, presencia ele as cenas habituais de bairros com todos os problemas que vemos hoje afligindo os moradores das cidades brasileiras.

Mas deve ser destacado o que ele diz. Que presenciando as coisas que tornam a vida do cidadão comum mais aflitiva, ele se entristece. Está aí um sentimento que o torna diferente de muitos que hoje, alienados por uma série de circunstâncias, não veem ou preferem não sentir mais qualquer dor que seja pelo dia a dia que presenciam.

Mas o leitor de Sobral sente-se triste e por vezes se deprime com o que vê. Entendo seus sentimentos. E o elogio profundamente por ainda ter a capacidade de sentir as coisas assim, de observar a realidade, mesmo que dolorosa e em seu íntimo sentir-se motivado a fazer o melhor pelas outras pessoas que vê em situação desoladora. No Brasil de hoje poucos são os que ficam tristes com as coisas que vemos, com a nossa nação tão por baixo, apesar do retrato feliz que a imprensa brasileira procura passar, como sempre querendo agradar a quem está no poder. Grandes obras são vistas e propagadas enquanto que o que acontece nos cruzamentos de trânsito, nos bairros mais humildes, nas ruas, tudo isso fica em segundo plano, como pessoas de fora de um grande banquete, contidas por uma cerca e ignoradas pelos festivos governantes em seu repasto de verbas desviadas.

Nos dias de hoje, quando pessoas esclarecidas andam pelas ruas sem nenhum constrangimento com copos de bebida nas mãos, considerando o alcoolismo como comportamento civilizado, quando administradores políticos destroem livros, quando magistrados sentenciam em causa própria provocando a ruína do cidadão ou seja, quando toda a trama social se desfaz na nossa frente, tudo isso é mesmo para entristecer, para deprimir.

Por isso é de se destacar o que diz o leitor de Sobral:

"...porém em meu mundo particular, busco refúgio nos poucos livros que tenho, não para esquecer do que está acontecendo lá fora,mas sim para primeiro munir-me de conhecimento para auxiliar os que são estimulados a não desenvolver uma visão de mundo que os faça melhorar suas condições de vida, em todos os seus aspectos."

No outro mundo além desse, Monteiro Lobato não poderia estar mais feliz, mais reanimado ao ler essas palavras, ao tomar ciência do testemunho desse cidadão, que com seus livros, procura continuar a construção de sua consciência cívica, de sua postura de brasileiro que faz por merecer o caminho dos grandes vultos que tivemos em nossa história, em que pesem os dias atuais, quando de forma esmagadora faz-se verdade o profético ditado de Rui Barbosa:

"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto."

Mais do que nunca deve ser admirada a atitude do leitor de Sobral, que mesmo cercado por uma realidade que entristece qualquer cidadão, procura com seus livros, como ele mesmo diz, munir-se de mais conhecimento para fazer o melhor possível para poder ajudar o povo de sua nação, para tentar melhorar esse Brasil de hoje.

Existe mesmo uma vida após essa? Então Rui Barbosa sabe que cidadãos como o leitor de Sobral não estarão sozinhos na luta por melhorar tudo o que está errado. Monteiro Lobato sente que a frase que nos legou de que "Um país se faz com homens e livros" mais do que nunca retoma vida.

Mais do que um simples observador dos dias de hoje, o leitor de Sobral é no fundo, acima de todas as dificuldades, um exemplo perfeito do que entendemos como verdadeira cultura e lealdade ao que há de melhor em sua nação.

Com sua capacidade de observação e com seu altruísmo, dia a dia torna a si mesmo uma construção de tudo o que é melhor para esse sofrido Brasil de hoje.

sexta-feira, 19 de março de 2010

P29 Renovação

Pela força...

Para o observador atento nada tem sido mais desolador do que olhar de forma cuidadosa o panorama político do Brasil atual. A palavra política aqui tem uma abrangência significativa. Me refiro ao que podemos congregar nessa palavra como um todo para retratar uma nação, ou seja, o executivo, o legislativo, o judiciário, a sociedade como um todo.

E o retrato que emerge desse olhar é uma completa e desoladora ruína moral, que espelha de modo incontestável a situação desses poderes no Brasil. É no meio dessa ruína além de moral, humana, que habitam por assim dizer seus membros. Já acostumados com essa habitação que lembra mais a dos fantasmas dos contos de terror, aos poucos foram se moldando aos locais onde moram.

De forma espantosa, como no romance de Franz Kafka, "A Metamorfose" foram tornando suas mentes e seus hábitos tão parecidos com as ruínas que hoje, ruínas e moradores, fantasmas e pedras espalhadas são indistinguíveis. Em seu romance surrealista, Kafka narra o momento assombroso em que o personagem Gregor Sansa percebe que havia se transformado numa barata.

De forma semelhante, os membros desses três poderes no Brasil de hoje também se transformaram em insetos. Mas por vontade própria. No conto de Kafka, Gregor Sansa, abismado, percebe sua horrível metamorfose, da qual sequer sonhara em seus piores pesadelos e pede socorro para retomar a forma humana. Já os membros dos nossos três poderes voluntariamente foram se deixando levar por essa metamorfose que nada mais é do que se tornarem naturais habitantes da paisagem política criada pela infame constituição de 1988, que é cantada em prosa e verso pelos formas de vida parasitárias que por ela foram criadas e que às custas do Brasil e do sangue do povo brasileiro vivem.

Nada mais natural do que a farsesca "constituição cidadã" ter-se tornado apenas um chão fervilhante de insetos políticos dos mais repugnantes, alguns alçando voos aqui e alí. sendo por assim dizer, seus bem adaptados habitantes, em especial os que se regalam com as maiores alturas nesse meio institucional, que por ora temos que aguentar com extrema náusea. Bem, uma barata voa e crê que seu voo alcança ápices gloriosos para a natureza e no entanto continua sendo uma barata.

Não poderia ser de outra forma. Urdida por uma das mais infelizes e corruptas assembléias constituintes que o Brasil já presenciou, chamada por seus poucos críticos de "assembléia prostituinte" tudo mostra que nesses 22 anos de existência a tão falada "constituição cidadã" pode, em vista de tudo o que tem produzido de insetos políticos, ser de hoje em diante chamada de "prostituição cidadã". Assim ao menos a atividade a que se dedicam seus membros se torna mais específica para comentários e reflexões. Continua porém a repugnância de sua metamorfose, voluntária e desejada para se adequarem a esse meio onde vicejam.

Porém mesmo a natureza como a conhecemos, além da política propriamente dita, tem seus mecanismos de limpeza. Um deles é expresso pelo ditado "Ignea Natura Renovatur Integra" que significa que "Pelo Fogo a Natureza Inteira se Renova". O Brasil de hoje, em que pesem os cantantes meios de imprensa, sempre vendidos ao poder, se assemelha a um imenso galpão onde o cheiro de gasolina é mais do que perceptível. Uma fagulha, dessas que a história dos povos sempre faz surgir e tudo voa pelos ares. E com as chamas desaparecem essas repugnantes formas políticas que hoje infestam esse país.

O certo é que por bem, essas pragas jamais irão embora. Que seja pela força então.