quarta-feira, 16 de maio de 2012

P103 Os patriotas de aluguel

O proprietário manda, seus empregados trabalham...
O senador Fernando Collor de Mello interpretou nos últimos dias a figura do impoluto cavaleiro de capa e espada que surge para salvar a jovem república ameaçada. O mesmo homem que saiu da presidência expulso pelas piores mazelas morais, hoje faz o papel de dedicado defensor da moralidade, já que o antigo ocupante do cargo, Demóstenes Torres, caiu desmascarado e pego em flagrante como intermediário de um contraventor em ocupação integral e defensor da moralidade nas horas vagas.
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Defendendo a convocação de Roberto Civita e seu jornalista Policarpo Júnior, que interpretavam respectivamente os papeis um de editor chefe do contraventor e outro o de pombo correio dos dois, o senador quer que acreditem que ele tem algum embasamento moral na sua pretensão, quando na verdade é a única forma de se vingar da Editora Abril, já que desde que recebeu dela o empurrão final quando estava por um fio na presidência jamais conseguiu com suas pequenas empresas de notícias dar-lhe um arranhão que fosse. Mas o senador e a Editora Abril já foram muito bons amigos no passado. Senão vejamos algumas imagens antigas.  
Em 1989, favorecido pelos laços com a Editora Abril que ridicularizava seus oponentes e enaltecia o senador como herói da moral, a revista Veja o colocava na capa como o caçador de marajás. Graças aos milhões de leitores da revista que até hoje não aprenderam a ler nas entrelinhas, Collor terminou eleito e com sua infame República de Alagoas fez tamanho estrago na moral republicana que a revista que o protegia tanto precisou de alguém para pintá-lo das piores cores possíveis. Não era por patriotismo. A Editora Abril apenas pensava nos negócios das privatizações desde a eleição de Collor.
E em 1992 esse alguém foi Pedro Collor, que preterido em negócios da república de Alagoas com sede na casa da Dinda, famosa na época ironicamente pela sua cachoeira artificial, decidiu denunciar tudo o que sabia de errado na presidência, sob as vistas do então presidente Collor. Conseguiu assim a revista Veja na época o que pretendia conseguir nos dias de hoje com Demóstenes Torres, já que a revista denunciava através dele somente nomes no índex de inimigos dela sem nem de leve tocar nos assuntos da construtora Delta, de propriedade do contraventor e que abastecia seu editor chefe Roberto Civita com todas as informações que ele precisava para atingir seus desafetos políticos e porventura comerciais. 
Hoje, enquanto os brasileiros olham entre estarrecidos e sem saber o que fazer, revistas concorrentes da Editora Abril se dividem entre a crítica ferrenha a tudo o que ela representa e entre a defesa das atitudes que seu editor chefe e seu jornalista tomaram de serem informados de tudo o que ocorria de errado dentro do governo sem terem feito uma denúncia que fosse. Ao mesmo tempo auferindo lucros, foram assim indiretamente financiados pelos crimes do contraventor e agora posam de "heróis do jornalismo investigativo". E são defendidos pelas outras casas editoras que tem nas costas os mesmos tipos de cumplicidade em crimes assim. Ou como falam nas redações, me ajuda que eu te ajudo. Como dizia Millôr Fernandes, a imprensa brasileira sempre foi canalha. Mas gosta de posar de virgem impoluta.
Para piorar o quadro de corrupção, com as denúncias de que o procurador geral nada fez para impedir os crimes de Carlinhos Cachoeira em 2009, ele, três anos depois surge com a desbotada explicação de que nada fez para que o contraventor prosseguindo em seus crimes de corrupção durante todo esse tempo fosse "envolvido de forma irreversível pelas investigações". Qualquer pessoa pode se perguntar o que teria feito o procurador se entre as denúncias levadas a ele constasse de forma clara e inequívoca uma trama de Carlinhos Cachoeira para sequestrá-lo, por exemplo. Teria ficado ele em silêncio esperando o crime ser cometido, para depois dizer que isso era "para não atrapalhar as investigações"?
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Fica cada vez mais triste comparar as grandes comissões de inquérito do Congresso americano em casos que eletrizaram a opinião pública mundial, que pôde acompanhar em audiências públicas desde os episódios da Guerra do Vietnã até o caso Watergate. Tudo o que interessava ao bem da nação americana era público e sabido.
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Aqui no Brasil, em seu minúsculo congresso, minúsculo em coragem e decência, tudo é passado em conchavos numa audiência secreta, tudo se ajeita num governo de compadres e comadres no poder. Nada de novo, visto que foi exatamente a confidencialidade dos gastos das obras da Copa do Mundo que renderam centenas de milhões de reais para as empresas de Carlinhos Cachoeira. Se as obras em que ele entrou, tem gastos secretos, porque a audiência em que seu nome é citado não deveria ser secreta?
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Carlinhos Cachoeira emerge assim como o maior proprietário da coisa pública no Brasil e como proprietário, quando ele manda, seus empregados trabalham, tanto no congresso como nas redações de jornais. 
O certo é que nesta república de muitos "patriotas" de um lado e do outro de muitos idiotas que ainda não aprenderam a ler uma revista nas entrelinhas, prossegue tranquilo, apesar dos percalços, o contraventor Carlinhos Cachoeira, que vê de dentro de sua cela uma CPI que investiga crimes em salas fechadas de onde pouco se sabe o que acontece, senadores que ostentando poder sobre o cidadão comum não tem coragem de intimar governadores acusados, recebem de seus pares arquivos apagados ou sem ordem nenhuma, com o que as investigações andam em círculos, enquanto repórteres correm para todos os lados sem nada saberem.
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Longe desses "patriotas" de aluguel, longe dessa patriotada toda, sozinho em sua cela, certo de seu dinheiro está seguro, o contraventor Carlinhos Cachoeira deve rir de tudo isso. Deve rir de saber que sim, dá ordens a esses "patriotas" mas nem mesmo ele esperava que fossem cumpri-las assim, com tanta obediência. Essa é a república dos "patriotas", onde manda o proprietário Carlinhos Cachoeira.
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