sábado, 4 de junho de 2011

P71 Nos tempos do Soviete Supremo

O Soviete Supremo à moda brasileira..
Ao que tudo indica, andou sendo reencenada por esses dias uma versão brasileira do Soviete Supremo da finada União Soviética. E parece que a encenação ainda vai longe. Com a mistura da apatia da presidente Dilma frente ao choque das denúncias contra o ministro Antonio Palocci, a intervenção de Lula nos bastidores e os desmentidos dados pelo ministro via Rede Globo, o cenário não poderia lembrar outra coisa.
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Para quem não viveu aqueles tempos, o Soviete Supremo da União Soviétia trazia sempre em suas reuniões uma leva de dirigentes octogenários, que além de comunistas ortodoxos, eram quase sempre doentes e cambaleantes, dos tipos mais fáceis de serem manipulados numa estrutura de poder, mesmo que alcançassem o cargo máximo de secretário-geral do Partido Comunista. Facções em luta pelo poder se aproveitavam de homens idosos e doentes como se fossem marionetes, com as verdadeiras decisões sendo tomadas nos bastidores.
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Assim, nos telejornais da época aparecia a figura de um Leonid Brezhnev apático ou cambaleante durante anos, que levado ao poder em 1964, ao longo dos anos foi adoecendo e se tornando combalido enquanto a imprensa estatal a tudo desmentia, até que em 1984 ele morreu. Em seu lugar entrou Yuri Andropov, igualmente enfermo, com a promessa de reformas e mudanças e que de forma surpreendente viveu apenas 2 anos. Claro, não teve tempo de fazer as reformas políticas que pretendia ou que pelo menos dizia querer.
Para o novo secretário-geral escolheram Konstantin Chernenko, que de forma mais surpreendente ainda viveu apenas 1 ano, sempre acompanhado dos desmentidos oficiais que procuravam ocultar seu estado de saúde. A todas essas escolhas os comunistas do Brasil assistiam dizendo que o novo líder seria a renovação do comunismo. Nas reuniões plenas do Soviete Supremo todos os membros concordavam com a escolha. Não havia um único voto contrário, que seria a mesma coisa que cometer suicídio.
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Não era surpreendente que os eleitos morressem logo. O surpreendente era que o colégio eleitoral do soviete supremo escolhesse homens tão debilitados esperando que vivessem um longo tempo. Mistificações, notícias de ocasião e conchavos de gabinetes era tudo o que acontecia nos círculos do poder de então, até que uma vez eleito, Mikhail Gorbachev realmente renovou tudo e favoreceu a implosão da União Soviética em 1991, evitando uma guerra civil.

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O roteiro do que realmente aconteceu na época da Guerra Fria em tudo é semelhante ao que acontece nos dias de hoje em Brasília, onde o que se pode chamar de Soviete Supremo do Partido dos Trabalhadores, junto com o que podemos chamar também de Soviete Supremo dos partidos que compõem o governo, está tendo um trabalho difícil para debelar a crise das denúncias contra o ministro Antonio Palocci. Aqui não existem dirigentes octogenários, conservadores, doentes e fáceis de serem manipulados, mas pode existir uma presidente doente cercada por corruptos acuados por denúncias, um grupo de comunicações se aproveitando da situação e um grupo de "aliados" que é em tudo semelhante a uma matilha de lobos, tentando conseguir seu quinhão de poder, se não o poder definitivo.
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Frente ao estado de visível abatimento da presidente Dilma Roussef, em certos momentos quase parecendo no limite de suas forças frente às câmeras de televisão, até mesmo ao ex-presidente Lula tiveram que recorrer, em vista da aparente incapacidade da atual governante de decidir de uma vez por todas a questão, demitindo o ministro, que pelas respostas evasivas que tem dado, já deu mostras suficientes de estar mais do que comprometido em atos nada aceitáveis com sua empresa, muito provavelmente envolvida com o dinheiro público.
Em sua busca de garantir o poder de qualquer forma, entram em cena os famosos conchavos entre os amigos do poder, tanto com os que estão no cargo atualmente como entre os que um dia já tiveram salas perto do gabinete da presidência da República.
No meio de tudo isso, oferece seus préstimos ao governo a tão falada Rede Globo, inimiga visceral de Lula, Dilma e do Partido dos Trabalhadores. A mesma Rede Globo que exultava nos seus editoriais as derrotas de Lula em eleições anteriores e fez todo o possível para derrubá-lo nas vezes em que ele esteve envolvido pelas denúncias de corrupção de expoentes do seu governo, ofereceu ao ministro Palocci uma agradável entrevista pré-gravada onde as perguntas aparentemente difíceis ofereciam amplas saídas para generalizações, respostas vagas e falas sem conclusão nenhuma.
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Reservou-se o ministro Antonio Palloci o direito de ocultar muitas respostas sob essa névoa de evasivas com o argumento de proteção do sigilo econômico e de nomes de terceiros, seus ex-clientes, enquanto que no caso do caseiro Francenildo que teve seu sigilo bancário quebrado e sua conta corrente na Caixa Econômica Federal exposta ao público, o mesmo Antonio Palocci não mostrou nenhuma reserva ou constrangimento em expôr completamente o caseiro que o denunciava a todos os telejornais. Talvez porque o caseiro Francenildo não fosse cliente dos negócios do então ministro.
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Na época o depoimento do caseiro Francenildo numa CPI foi impedido por uma liminar concedida ao senador Tião Viana do PT, que ao invés de ouvir tudo para tudo esclarecer, teve a inestimável ajuda do STF para silenciar o depoente. Uma tentativa de incriminar o caseiro como tendo recebido suborno para o depoimento foi veiculada pela revista Época, que é propriedade das Organizações Globo, a mesma que comanda a Rede Globo. E apenas um dia depois de veiculada, a reportagem foi desmentida.
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Talvez por isso a Rede Globo tenha recorrido ao seguro esquema de uma agradável entrevista pré-gravada, sem participação ao vivo de alguma assistência, que poderia terminar em revelações surpreendentes de última hora e fora de controle.
Em tudo e por tudo seus repórteres e apresentadores parecem membros dos jornais estatais da finada União Soviética, com um senso de oportunismo político dos mais indecentes, quando não de uma subserviência ao poder inacreditável, seja ele de esquerda, de direita ou econômico de grupos estrangeiros, que sempre protegem e nunca denunciam.

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No meio de tais aventureiros políticos, surge assim mais uma vez e de forma incontestável esse oportunismo nauseante da Rede Globo e por consequência, das Organizações Globo, que no fundo desejando ver fora do poder esse governo, ainda assim concede ao ministro uma privilegiada entrevista, esperando uma compensação pelos serviços prestados.
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Poderia ser na contratação de milionárias verbas publicitárias de empresas estatais como a Petrobrás, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal? Seria mesmo lucrativo.
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Outros órgãos de imprensa, com uma ou duas honrosas exceções, como revistas semanais e jornalões tradicionais, de propriedade de famílias conservadoras, longe de serem órgãos contestadores e verdadeiros oponentes políticos em defesa do Brasil e do povo brasileiro, apenas defendem seus interesses e lucros.
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Na medida em que uma denúncia favorece seus negócios, denunciam. Na medida em que seus negócios estarão mais favorecidos com a ocultação de atos de corrupção, é o que fazem, não falando uma palavra ou imprimindo uma linha sequer sobre isso.
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De forma diferente, os jornais estatais da União Soviética que defendiam os secretários-gerais do Partido Comunista não contavam com verbas ou favores futuros, apenas eram obrigados a isso sob pena de prisão. Eram assim mais autênticos pelo menos. Ou escreviam o que o governo queria ou iam presos. Aqui os jornalistas podem barganhar o que vão ou não escrever, o que vão denunciar ou o que vão esconder.
Nesse soviete supremo do jornalismo tropical encenado por aqui, muitas denúncias apresentadas com as cores de patriotismo ou jornalismo investigativo não passam de dores de favores não concedidos ou então de obediência a ordens de desafetos daqueles que estão no poder.

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Já com os "aliados" de Dilma, que ela escolheu como aliados de campanha mas são uma matilha de lobos, o estado de abatimento da presidente frente às câmeras de televisão parece a eles uma dádiva divina. Estando ela em tal situação, o que não é improvável, visto que teve que pedir socorro até ao ex-presidente Lula, homens do tipo mais condenável como José Sarney, Renan Calheiros, os antigos discípulos do finado Antonio Carlos Magalhães e outros totalmente sem caráter que Dilma fez questão de cortejar em busca de apoio político, serão os primeiros a tentar de tudo contra ela, para que na verdade assumam o poder através do vice-presidente Michel Temer.
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E nessa infeliz conjugação de interesses dos mais baixos e sempre contra o povo e a nação brasileira, se desenrola essa mísera e patética reedição tropical do Soviete Supremo da União Soviética.
O que não se deve esquecer são as lições da História. No antigo Soviete Supremo russo, todos acreditavam na eternidade do sistema. Ao assumir o poder, percebendo que a queda da União Soviética era inevitável, Mikhail Gorbachev fez as inadiáveis reformas que levariam à queda do regime, mas conseguiu evitar que isso degenerasse numa guerra civil onde os partidários do antigo sistema de corrupção tentariam ainda envolver o poder militar para voltarem ao poder.
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Mais surpreendente do que o desfile de líderes semi-mortos foi a rebelião das Forças Armadas, que pela primeira vez em mais de meio século deixaram de obedecer o centro de poder.
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Aqui no Brasil, essa vai ser a única forma de derrubar esse sistema onde os três poderes, totalmente aliados de um núcleo de poder corrupto, acreditam-se eternos e impunes.

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