
Engenheiros e cientistas dos mais responsáveis alertavam na época para o perigo do que chamavam de loucura nuclear ou seja, a construção em número crescente de usinas nucleares, com a aprovação governamental baseada em relatórios que eles consideravam no mínimo fantasiosos sobre a tão alardeada segurança. Esses cientistas foram marginalizados pelas corporações, por governos e pela mídia da época. Para piorar, muitas usinas foram construídas próximas do mar, pois isso barateava e muito os custos de uma estação de bombeamento e represamento da água do mar para a refrigeração dos reatores. Para que construir tais estações que deixariam a usina a uma distância segura do mar, se era mais lucrativo construí-las a distâncias de, no máximo 200 metros do mar? Contra todas as objeções, eram apresentados estudos nunca comprovados de segurança absoluta. Uma mídia que no fundo queria ser enganada pensando nas verbas publicitárias propagou essas notícias em todos os países.
-Acidentes já aconteceram. Na década de 50, dois grandes acidentes na antiga União Soviética e na Inglaterra serviram de lição, esquecida em meio às pressões das grandes corporações. As mesmas que hoje, como a Tepco do Japão, que construiu a usina de Fukushima de frente para o mar, já à beria da falência, pede socorro ao governo japonês que estima em mais de 200 bilhões de dólares os custos para enfrentar a catástrofe do vazamento nuclear. Aos poucos o governo e a mídia vão deixando a população saber que aquela área do país está praticamente perdida, talvez por quase um século. Este é o balanço do potencial de desastre das usinas nucleares, neste caso de uma só usina nuclear, que como seus construtores asseguravam, era totalmente segura. Tão segura que podia ser construída na beira do mar.
-Texto originalmente publicado no bilogue Cartas no Dia em 06.05.11.
Já aconteceu de verdade antes e depois...
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Filme recomendado
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A Síndrome da China (The China Syndrome, EUA, 1979)

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Apesar de uma produção até simples para os padrões do cinema americano, é assim que podemos descrever "Síndrome da China", um filme que retratou de forma vívida um drama real que já aconteceu bem antes que ele fosse produzido e inacreditavelmente aconteceu na época apenas 12 dias depois do lançamento do filme e no Japão acontece nos dias de hoje enquanto estas linhas são lidas. No tempo em que o leitor vê este texto, na agora antiga usina nuclear de Fukushima no Japão e mais novo jazigo nuclear do mundo, tudo o que o personagem principal deste filme mais temia acontece a cada minuto, com a massa de combustível nuclear aos poucos vazando para o mar.
-Apesar de uma produção até simples para os padrões do cinema americano, é assim que podemos descrever "Síndrome da China", um filme que retratou de forma vívida um drama real que já aconteceu bem antes que ele fosse produzido e inacreditavelmente aconteceu na época apenas 12 dias depois do lançamento do filme e no Japão acontece nos dias de hoje enquanto estas linhas são lidas. No tempo em que o leitor vê este texto, na agora antiga usina nuclear de Fukushima no Japão e mais novo jazigo nuclear do mundo, tudo o que o personagem principal deste filme mais temia acontece a cada minuto, com a massa de combustível nuclear aos poucos vazando para o mar.

Jack Lemmon, um dos artistas mais expressivos de Hollywood interpreta o engenheiro-chefe de operações de uma uma usina nuclear americana, que em determinado dia percebe apavorado que por um erro do painel de instrumentos quase haviam provocado a fusão do reator e pior ainda, percebera com isso um defeito na construção do sistema de resfriamento. Sem ele saber estavam vendo tudo os repórteres de uma emissora de televisão, com a jornalista interpretada por Jane Fonda junto com Michael Douglas como o cinegrafista, que estavam ali para uma reportagem sobre o dia a dia de uma usina e haviam chegado no exato momento do incidente.

Correndo contra o tempo, Jack conta apenas com contatos com a repórter para tentar denunciar o que poderia acontecer e ao voltar para a usina encontra uma operação de teste em força máxima em andamento, o que poderia provocar exatamente o que ele temia, a fusão do núcleo radioativo. Sem alternativas ele invade a sala de controle armado, expulsa todos de lá e tomando o controle da usina, passa a exigir a presença da imprensa para denunciar tudo o que estava acontecendo.
-Fora da sala de controle, a única preocupação dos diretores da empresa é fazer o desligamento externo dos circuitos para neutralizar as ações do engenheiro. Com a entrada da repórter na sala para entrevistar Jack ao vivo, o maior temor dos diretores da empresa já acontecera. Era inevitável a paralisação da nova usina, o fechamento da que estava com problemas e acima de tudo a perda financeira. Em nenhum momento os diretores da empresa levavam em conta que estavam com um núcleo de combústivel nuclear com problemas, arriscando uma catástrofe de proporções colossais. Interessava-lhes apenas preservar os lucros da empresa e é claro, seus lucros pessoais. Uma catástrofe nuclear e milhares de vítimas estavam fora das considerações.

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Apenas 12 dias depois do lançamento do filme, a usina nuclear de Three Mile Island sofreu um acidente com exposição do núcleo radioativo em quase tudo semelhante aos acontecimentos do filme. Em 1986 o mundo ficou estarrecido com o acidente de Chernobyl, que hoje é um gigantesco jazigo nuclear. Em 2011, depois de um tsunami que provocou milhares de mortos e a destruição das salas de controle da usina de Fukushima no Japão, o núcleo de combústivel nuclear entrou em fissão sem controle, provocando a explosão de um dos reatores que até agora permanecem com sua reação sem controle, com um providencial esquecimento da mídia. A atitude do grupo de dirigentes da empresa foi de minimizar custos e até mesmo racionar a comida dos técnicos que trabalham na contenção do desastre, enquanto faziam apressadas reuniões para tentar acalmar os ânimos no mercado de ações.
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Na época da construção da usina por uma empresa americana, um engenheiro demitiu-se do projeto denunciando o que ele considerava absurdas falhas de segurança no projeto, em especial a usina ser tão próxima do mar numa região sujeita a terremotos como o que aconteceu.

Nos tensos momentos em que a repórter entrevista o engenheiro dentro da sala de controle, nas coisas que ele consegue dizer até o desfecho final, fica uma clara imagem de como deveriam ser operados esses sistemas, que ao invés disso são submetidos a um lógica de mercado absolutamente insana.